Como entender o que quer dizer o choro de um bebê nos primeiros meses de vida? E como saber se a queixa de dor não é pura manha? Dor é uma das questões médicas mais difíceis de diagnosticar e tratar. Especialistas já sabem que a intensidade da sensação varia de pessoa para pessoa por uma série de questões como fatores fisiológicos e culturais, sensibilidade e experiências anteriores. Dor é um sinal de alerta de que algo não vai bem e, por isso, em crianças, a atenção deve ser redobrada.
Cerca de 40% das crianças e adolescentes queixam-se de dor que ocorre pelo menos uma vez por semana. Além disso, a dor crônica afeta de 15% a 20% delas no mundo. “Crianças sentem vários tipos de dor, desde a cólica do bebê até as ligadas à prática de esportes. Porém, por falta de entendimento, muitas vezes elas são menosprezadas pelos pais e até médicos”, afirma o pediatra e reumatologista Claudio Arnaldo Len, do Hospital Israelita Albert Einstein, e um dos autores do Consenso sobre Dores Pouco Valorizadas em Crianças, lançado em 2011 pela SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria). Nove anos depois de a publicação ser disponibilizada, o assunto continua atual e ainda tira o sono de muitos pais. Isso porque, lembra o médico, pessoas muito expostas à dor na infância se tornam mais sensíveis a ela na vida adulta.
Mãe de dois filhos, a bióloga e professora de biologia Luiza Moreira, de 37 anos, sofreu no início da maternidade para entender os sinais de dores dados por Maytê, a filha mais velha, que hoje tem nove anos. “Ela tinha muita cólica ao longo do dia. No começo era difícil identificar. Primeiro eu pensava que era fome e dava o peito, depois via se estava com a fralda suja. Demorou, mas fui aprendendo a lidar com isso de forma que ela sofresse menos”, conta. Prestar atenção no comportamento dos filhos é fundamental para evitar que os pequenos sofram. O filho mais novo, Saul, de cinco anos, quase nunca reclama de dor. “Os dois são bem diferentes. Então, quando ele diz que está doendo alguma parte do corpo, já tento descobrir a causa, medicar ou levá-lo ao pediatra”, afirma.
Muitas crianças usam o choro ou aumentam a expressão da dor para chamarem atenção. Por isso os pais têm que ficar atentos a alguns critérios. Por exemplo: não é normal um bebê chorar por três, quatro ou cinco horas seguidas. Em casos assim, é preciso eliminar possibilidades para chegar a uma possível causa. Quanto às dores agudas, provocadas por quedas ou batidas, os adultos devem observar se há marcas ou inchaços no corpo da criança, se ela está mancando ou tendo alguma dificuldade de movimentação. Crianças não têm que sentir dor, mas também não podem tomar remédio sem motivo. Então, em caso de dúvida, procure um profissional.
Conhecer as principais dores e como elas se manifestam também ajudam a aliviar o sofrimento dos pequenos. As principais foram listadas no Consenso de Dores Pouco Valorizadas em Crianças:
Cólica do recém-nascido: caracterizada pelo choro constante acompanhado de gritos, excesso de gases e flexão dos joelhos, é comum até os quatro meses de idade, com picos entre os 15 dias de vida e dois meses. “É uma dor que vai e vem a cada duas ou três horas aproximadamente e pode estar ligada também à imaturidade do intestino, alergia a leite (consumido pela mãe) ou refluxo”, diz Cláudio Arnaldo Len. A amamentação não alivia e não há estudos que comprovem o uso de medicamentos
Dor pelo nascimento dos primeiros dentes (erupção dental): o tamanho do incômodo varia de criança para a criança, de acordo com suas características individuais. Tem início por volta do sexto mês de vida e término com o nascimento dos últimos dentes. Os sintomas mais comuns são inflamação nas gengivas, salivação, coceira ou irritação local (percebida pela vontade de morder objetos ou os dedos) e febre. Pode ser acompanhada ainda de dificuldade para dormir.
Cefaleia: é mais frequente entre 9 e 12 anos, atingindo de 15% a 20% das crianças, e na maioria das vezes é idiopática, ou seja, não tem causa definida. A recomendação é verificar a frequência e duração das dores e fazer associações. “Se a dor vai ficando mais forte, se atrapalha a rotina da criança, se faz com que ela acorde de madrugada ou se está sendo constante, é hora de procurar um especialista”, explica pediatra. De acordo com ele, muitos pais associam as enxaquecas a causas oftalmológicas. “Mas isso é raro, quando a questão é visão, as dores costumam acontecer no fim do dia, depois de um dia inteiro na escola ou da leitura”.
Dor do crescimento ou dos membros: são dores musculoesqueléticas (pernas e braços, principalmente). Acomete com mais frequência meninas, na faixa de quatro a 14 anos. Não tem um motivo esclarecido pela medicina (não é anatômica ou inflamatória) e são aliviadas com massagens ou depois de uma noite de sono.
Fibromialgia infantil: dor musculoesquelética crônica (com duração de pelo menos três meses) que não tem causa definida. Acompanha sintomas como distúrbio do sono, depressão, ansiedade e cansaço. O diagnóstico é feito a partir da eliminação de outras doenças e o tratamento inclui atividade física, psicoterapia e, em alguns casos, medicamentos.
Disfunção Temporomandibular (DTM): alteração da articulação que liga o maxilar à mandíbula que pode causar dor e desconforto no maxilar, dificuldades para mastigar e estalos e travamentos das articulações da mandíbula. O tratamento pode incluir desde medicamentos até aparelhos ortodônticos e terapia, uma vez que a DTM causar prejuízos como redução da autoestima.
Dor do esporte: como o próprio nome diz, está relacionada à prática de atividades físicas e exercícios. As queixas mais comuns são dores nas pernas e na região pubiana. Devem ser observadas com atenção pelos pais porque podem estar relacionadas à inflamações, luxações, torções, problemas nos ligamentos.
Dor abdominal recorrente: quando dor abdominal é forte o suficiente para interferir nas atividades do dia a dia da criança e ocorre pelo menos três vezes seguidas e está associada com sintomas como alterações frequentes nos hábitos intestinais (diarreia e constipação) é hora de procurar um pediatra. Este tipo de dor é um sinal de alerta e pode estar relacionada a uma série de doenças, como: infecções (urinária, por exemplo), inflamações (doença de Crohn), distensões e doenças parasitárias.
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