A pandemia do novo coronavírus trouxe à goiana Jane Borges, Miss Brasil Mundo 2006, preocupações além do isolamento social e do risco de contágio. Isso porque ela faz uso contínuo da hidroxicloroquina para controle do lúpus, doença com a qual ela convive desde criança. A hidroxicloroquina tem sido pesquisada por cientistas com uma forma de tratamento contra o vírus. Não há estudos científicos conclusivos sobre o uso do medicamento na Covid-19.
“As pessoas nem sabem usar o medicamento e acabaram com o estoque. Vejo com muita tristeza essa corrida. Lúpus é uma doença inflamatória causada quando o sistema imunológico ataca seus próprios tecidos. Eu tinha infecções recorrentes, como em ouvido e garganta, muitas dores nas juntas, púrpuras…”, diz Borges, de 35 anos.
Para controlar a busca desnecessária pelo remédio, os farmacêuticos agora exigem receita para comprar, o que não era necessário antes. E, com isso, quem tem lúpus precisa agora abandonar o isolamento e se arriscar a ter contato com o coronavírus em hospitais para conseguir o pedido médico.
“O medo é necessário, mas o desespero faz as pessoas terem atitudes mesquinhas. O nosso papel é fazer higienização correta das mãos e o máximo possível de isolamento, consciente dos sintomas”, diz Borges, que aponta haver pessoas com estoque do remédio, apesar da possibilidade de nunca usarem.
A cloroquina e a hidroxicloroquina são remédios usados no tratamento de malária, lúpus e artrite reumatoide. Apesar de não ter havido testes clínicos para determinar se eles de fato funcionam contra a Covid-19, o governo americano afirmou, no mês passado, que eles seriam usados em pacientes com a doença. No Brasil, os cientistas realizam as primeiras pesquisas sobre a eficácia e os efeitos colaterais do medicamento em pacientes com a doença.
Embora fale abertamente sobre a doença hoje, até mesmo para conscientizar as pessoas sobre o uso da hidroxicloroquina, Jane Borges diz que não falava sobre ela na época em que participava dos concursos de miss. “Não queria que ele [o lúpus] interferisse no meu reinado.”
“Eu comentava sempre que alguém falava sobre a pouca quantidade de cabelo que eu tinha ou sobre a minha imunidade baixa. A parte da queda do cabelo e não poder tomar sol eram as questões que mais pesavam. Alguns comentários me deixavam chateada e insegura, mas nunca me fizeram desistir.”
Borges começou a modelar ao mesmo tempo em que se aventurou no universo das faixas e coroas, aos 17 anos. Ela foi descoberta por uma rádio enquanto entregava panfletos pelas ruas de Goiânia. À época, a médica que a acompanhava não achou uma boa ideia participar dos certames de beleza.
Foi uma recomendação preventiva, já que o lúpus pode se manifestar diante de fortes emoções, mas “fui em frente porque vi que poderia ser uma forma de conseguir melhorar de vida. Graças a Deus tive um bom tratamento e a maior parte da minha vida estive em remissão, quando os sintomas são muito leves.”
Modelo plus size
Com resultados quase sempre muito bons, entre estaduais, nacionais e internacionais, Borges já disputou, ao todo, sete coroas. Começou representando Joviânia, cidade de seus familiares, no Miss Goiás 2003 e foi vice. No ano seguinte, ela retornou e venceu a competição, mas não se classificou no nacional.
Em 2006, ela levou o título de Miss Brasil Mundo e se tornou uma das poucas brasileiras finalistas no concurso internacional até hoje. Ao deixar os concursos, Jane Borges se formou em jornalismo e trabalhou em telejornais goianos.
Na mesma época, ela também entrou em guerra com a balança. Teve dificuldades para controlar o peso, devido a problemas hormonais e ao uso de medicamentos, mas se reinventou e hoje, aos 35, tornou-se modelo plus size.
“Quando eu comecei a ganhar peso foi um baque. Largar a minha profissão de modelo foi um processo doloroso e não lidei muito bem no começo. Sofri e precisei de ajuda para lidar com a ansiedade e a compulsão. Sabia que havia preconceito, mas o maior deles estava dentro de mim. Se a gente não se valoriza, quem está do lado de fora faz o mesmo”, afirma.
Jane Borges percebeu que poderia continuar no mundo da moda. “Aprendi a valorizar minha saúde e não me encaixar num peso só para ser aceita. É lógico que eu gostaria de estar mais magra, até pra melhorar meu desempenho em algumas atividades, mas sei que é preciso tempo e dedicação para não prejudicar minha saúde.”
No balanço de sua carreira como miss, Borges afirma que viveu “experiências que talvez muitas pessoas não tenham oportunidade [de viver] na vida”. Aprendi a ser uma pessoa melhor. Sei me colocar no lugar do outro e a responsabilidade de ser influenciadora, de transmitir mensagens positivas para pessoas que se espelham na minha história. Analiso sempre minhas atitudes e penso bastante em como ser exemplo.”
Fonte: Folha uol.
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