Os impactos da artrite reumatoide na qualidade de vida dos brasileiros são piores em relação a países como Argentina, Colômbia e México. A constatação é de um estudo inédito, apresentado no Congresso da Liga Pan-americana de Associações de Reumatologia (Panlar), que comparou o impacto da doença autoimune na produtividade e na força de trabalho do paciente. Entre os quatro países da América Latina, o Brasil tem, por exemplo, a menor taxa de empregabilidade entre os pacientes acometidos pelo problema.
O estudo Patient reported outcomes survey of employment in patients with rheumatoid arthritis(Empregabilidade de pacientes com artrite reumatoide, na tradução livre) demonstrou o grande impacto da artrite reumatoide na qualidade de vida e produtividade depois de acompanhar 309 pessoas com a doença nos quatro países. A doença inflamatória crônica, que afeta 1% da população adulta ao redor do mundo, ocorre quando o sistema imunológico, erroneamente, começa a atacar articulações saudáveis. Essa resposta imunológica provoca sintomas que podem variar em gravidade em cada paciente, incluindo dor nas articulações, inchaço e rigidez, e também a perda de função física.
Com o passar do tempo, os sintomas de artrite reumatoide podem se agravar e, com isso, tarefas diárias podem se tornar difíceis de ser realizadas, ocorrendo danos permanentes nas articulações. O fato de ocorrer mais comumente entre as idades de 30 a 50 anos, em plena idade laboral, mostra o grande impacto na trajetória profissional desses pacientes. Mais prevalente em mulheres do que em homens, os pacientes com artrite reumatoide não têm esperança de cura. O objetivo do tratamento é maximizar, por longo prazo, os aspectos de saúde na qualidade de vida do paciente, com o controle dos sintomas, prevenção de danos estruturais, normalização da função física e participação social.
Segundo o reumatologista Ricardo Xavier, chefe do serviço de Reumatologia do Hospital das Clínicas de Porto Alegre e coordenador da pesquisa para toda a América Latina, a artrite reumatoide pode se tornar uma doença bastante debilitante, com forte impacto negativo em vários aspectos na rotina paciente. A contribuição da pesquisa, que no Brasil também contou com a participação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), por meio da equipe do pesquisador Daniel Feldman, e do Cepic, com a equipe de Cristiano Zerbini, é importante no sentido de quantificar como a doença afeta o desempenho no trabalho e na qualidade de vida do paciente. “Tínhamos conhecimento desse impacto em estudos em pacientes europeus, mas as informações com os pacientes da América Latina eram limitadas”, explica Xavier.
O estudo revelou, por exemplo, que 80% dos pacientes entrevistados, dos quatro países, em média, reportaram problemas com dor e desconforto. Os brasileiros relataram mais enfaticamente o impacto negativo da doença na maioria dos aspectos avaliados, apesar de tendências semelhantes apresentadas nos quatro países. Os brazucas também apresentam a menor taxa de empregabilidade (40%), enquanto os argentinos a maior, com 73% dos pacientes empregados, seguidos pela Colômbia (61%) e México (54%). Em relação à sensação de dor e desconforto, os sintomas são reportados por 83% dos brasileiros, contra 67% dos argentinos, 70% dos colombianos e 71% dos mexicanos. “Embora tendências semelhantes tenham sido observadas em todos os quatro países, os pacientes brasileiros reportaram ser mais afetados na maior parte dos aspectos avaliados”, lamenta Ricardo Xavier.
O estudo, agora, que segue com outras análises, quer compreender a razão da discrepância entre os países latinos. “Colômbia, México e Argentina apresentaram resultados similares, próximos àqueles encontrados nos países europeus. Por que o Brasil tem dados piores? O desafio agora é explicar essa situação, que pode impactar nos protocolos de tratamento e no modelo de assistência oferecido no Brasil”, acrescenta Xavier.
Nem todos os piores dados, contudo, são brasileiros. A Colômbia lidera em horas de trabalho perdidas em função da enfermidade. A Argentina, por outro lado, tem mais horas efetivamente trabalhadas. “Mas quanto se olha para as variáveis de quanto a enfermidade afeta o trabalho, em todos o Brasil vai pior”, lamenta.
O reflexo da doença no país, contudo, pode dar uma ideia do impacto na vida dos nossos pacientes e ajudar na avaliação de custo/efetividade dos tratamentos, ajudando agências e o governo a definirem estratégias e medicamentos. “Como não tínhamos um estudo brasileiro nesse sentido, tínhamos menos subsídios para levar a quem dita o tratamento”, complementa o reumatologista. Os dados do estudo são baseados na percepção e no relato de pacientes sobre o impacto da artrite reumatoide na sua qualidade de vida e produtividade no trabalho. Os participantes, na época da avaliação, tinham entre 21 e 55 anos, e responderam questionários sobre a produtividade e dificuldade e atividade e limitações no trabalho. Essas ferramentas permitiram, por exemplo, medir o presenteísmo e o absenteísmo. Os pacientes foram acompanhados durante um ano.
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