É inegável que durante a vida é preciso rever alguns objetivos, mas, de vez em quando, são as circunstâncias que impõem mudanças drásticas, alterando completamente o que havia sido planejado e dado como certo. José Simões, 60 anos, de Jandaia do Sul, por exemplo, viu o sonho do negócio próprio escorrer entre os dedos. O apucaranense Nélio Dutka, 35, perdeu a visão total do olho esquerdo e 97% do direito. E Leandro Fenimani da Silva, 40, de Apucarana, foi surpreendido pela artrite reumatoide, que comprometeu de tal forma seu desenvolvimento físico e muscular, aos 16 anos, impossibilitando de andar sem o apoio de muletas ou da cadeira de rodas. Ao invés de sucumbir diante das dificuldades, eles decidiram levantar a cabeça e recomeçar.
Quem ouve o timbre alegre na voz de Leandro, gerente de uma agência da Caixa Econômica de Apucarana, nem de longe imagina as dificuldades pelas quais passou. Aos cinco, ele foi diagnosticado com artrite reumatoide, mas até aos 11 anos a doença, da família do reumatismo, não desencadeou nenhuma sequela. “A artrite que estava estabilizada, reapareceu. Foi uma evolução exponencial nas sequelas que deixou. Por isso, dos 12 aos 19 anos, fiquei afastado dos bancos escolares”, revela Leandro.
A artrite foi tão intensa que, além das dores, causou atrofias e perdas de movimentos nos membros superiores e inferiores, inclusive, ele deixou de andar. “Aos 16 anos, em plena adolescência, eu parei de andar. Eu tenho várias articulações comprometidas, as mãos não fecham, por exemplo”, comenta. Além dos movimentos, comprometeu também o crescimento e reduziu a força física. Leandro tem 1,65 de altura. “Para quem tem artrite reumatoide juvenil, eu cresci muito, mas menos que a média dos brasileiros”, pontua.
Diante do diagnóstico, vieram muitos questionamentos. “Não tem muitas explicações para entender de onde tirei força sem falar na base familiar e religiosa. A minha mãe (Rosa), desde que eu era menino, sempre me deixou muito ciente do que poderia acontecer comigo e isso me fez amadurecer mais cedo. Graças a essa preparação e a fé encontrei forças para superar”, confidencia.
No momento em que a doença estabilizou, aos 19 anos, Leandro retornou à escola regular. Não quis fazer o famoso supletivo para recuperar o tempo perdido. Concluiu o Ensino Médio técnico em Contabilidade e, depois, aos 29 anos, fez vestibular para Contabilidade na Faculdade de Ciências Econômicas de Apucarana (Fecea), concluindo o curso em 2004. Na sequência, engrenou na pós-graduação em Gestão Financeira e Contáveis e no MBA em Gestão Econômica.
Carreira – Apesar de ser um dos primeiros apucaranenses a receber o benefício social, por causa de sua limitação física, após concluir o Ensino Médio, Leandro não se acomodou e se preparou para fazer o concurso de técnico bancário – antigo escriturário – para a Caixa Econômica em 2000. Dentro das vagas destinadas aos portadores de deficiência, ele garantiu o primeiro lugar no Paraná. “O recebimento não causou comodismo. O benefício, para mim, era uma forma de auxiliar a minha educação, para eu galgar voos maiores”, diz.
Dez anos depois, quatro a mais que a média dos colegas, ele conseguiu sua primeira promoção. “Passei a ocupar a função de supervisor de canais. Um ano depois fui promovido a gerente e, de Londrina, voltei para a unidade de Apucarana. Internamente também precisei quebrar barreiras, mostrar que sou capaz e superar desafios”, avalia. Para conseguir a função de gerente, ele passou por 14 processos seletivos. “Se você tem um objetivo e não consegue alcançá-lo na primeira tentativa, tem que corrigir a rota, reajustar o prazo e buscar conhecimento para torná-lo realidade”, argumenta.
Para ele, de modo geral, a questão do preconceito, tanto por parte de empregadores quanto de colegas e clientes, tem avançado muito. Porém, ainda exige muita perseverança. “Todo mundo que busca uma promoção, precisa fazer 100%, eu tenho que fazer 110%, por exemplo. Depois que a pessoa conhece o trabalho, isso cai por terra, até porque somos analisados por números e resultados”, comenta sobre seu caso.
A colega de trabalho, Josiane Cristina de Souza, avalia que Leandro, por toda a sua trajetória, é um exemplo de superação, dinamismo e carinho por tudo que faz. “A família, que ele tem, é uma bênção, porque sempre fez de tudo para oferecer toda a estrutura para ele superar as dificuldades. Ele também tinha motivos para se retrair, mas, ao contrário, a cada dia sobe um novo degrau, mostrando que é possível ser feliz desde que se proponha a fazer”, assinala.
Realização pessoal – Além da realização profissional, no ano passado, Leandro obteve também uma grande conquista pessoal, a habilitação, que trouxe mais autonomia para o dia a dia. Até este momento, era o pai, seu Olinto, 63, que fazia questão de levá-lo e buscá-lo todos os dias do trabalho. Hoje em dia, é ele quem faz questão de fazer a vez de “motorista” da família, inclusive, para as irmãs, Vânia e Vanessa, 35.
Sobre seu jeito feliz e determinado de viver, Leandro tem uma explicação: “A vida que tenho consciência é essa e, por isso, é essa que eu tenho para realizar meus sonhos e encontrar felicidade em tudo que faço”, entende.
Novos planos
O apucaranense Nélio Dutka, 35, foi diagnosticado com glaucoma ainda na infância. O único incômodo naquela época eram os óculos “fundo de garrafa”, mas há cerca de um ano e meio, ele, após passar por onze cirurgias para tentar conter a doença, perdeu a visão total do olho esquerdo e 97% do olho direito. Em choque, no início, foi difícil aceitar, apesar de ter consciência que um dia a glaucoma pudesse evoluir desta maneira.
Com a ajuda da esposa, a enfermeira Delma de Oliveira, 42, Nélio procurou ajuda no Instituto dos Cegos, que o auxiliou no processo de reaprender atividades consideradas simples do dia a dia, como preparar refeições, andar pelas ruas, usar dispositivos que auxiliam o uso de tablets, computares e celulares. Aliás, a internet, hoje em dia, é uma de suas paixões, uma vez que ele adora passar horas pesquisando sobre diversos assuntos.
Após passar pelo processo de aceitação, Nélio deu início a uma nova rotina com sonhos bem diferentes. Antes de perder a visão no final de 2013, ele, que trabalhava junto com o irmão Vilson Dutka, 42, na construção civil, planejava expandir os negócios, construir uma casa mais confortável e trocar o carro.
Agora, depois de um período de reclusão, Nélio decidiu frequentar academia, retomou os estudos e planeja fazer faculdade de Psicologia. “Quando eu era adolescente, tentei buscar oportunidade de trabalho fora da construção civil, mas por causa das lentes grossas, encontrei muitas dificuldades e, então, decidi ser pedreiro. Agora, quero ser psicólogo para ajudar as pessoas a superarem os momentos de dificuldades”, diz com tranquilidade.
Nélio revela o motivo que fez o fez sair da inércia foi concluir que “tristeza não paga as contas”. Ele, que faz questão de vir sozinho às aulas no Instituto dos Cegos e na academia, tem como principal preocupação o momento de atravessar as ruas. “Infelizmente, a maioria das pessoas não respeita, ainda não está preparada para conviver com pessoas com deficientes”, diz.
Em casa, Nélio ajuda a esposa nas tarefas de casa, toca violão, teclado e adora pesquisar diversos assuntos na internet e, como antes, faz pequenos reparos.
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