Saudações, ao estar navegando pela internet durante o final de semana, quando buscava uma pesquisa com dados sobre estimativa de vida para pacientes com Artrite Reumatoide Juvenil, me deparei com este blog e com o depoimento de uma paciente, a Rhaylla Dayane. Me emocionei porque sei exatamente o que é passar pelas fases de angústia, e as intermináveis dores provocadas pela artrite.
Me chamo Francisco Carlos, e pela primeira vez contarei minha história de vida com a artrite reumatoide.
Tudo começou ao final da década de 70 em minha cidade natal, Caxias do Sul, Rio Grande do Sul, na Serra Gaúcha. Era estação de outono, e naquela região do Sul é muito comum em um mesmo dia, o clima fazer as três estações, outono, inverno e verão.
Residia na periferia da cidade, na época estava com 7 anos, e como todo menino normal, ao lado de colegas, logo no começo de uma manhã por volta das 07 horas fomos jogar bola em um campinho próximo a minha casa. Quando chegamos no local uma forte neblina estava presente, e mesmo assim começamos a jogar bola, e o tempo também foi se alterando aos poucos. A neblina se dissipou, o céu ficou nublado, e logo na sequência começou a chover, e nós continuamos jogando bola debaixo de chuva. Quando a chuva cessou, voltou novamente baixar uma neblina, mas acompanhada de um frio mais intenso, e continuávamos a brincar despreocupadamente. Com frio, nós já cansados, paramos para descansar e permanecemos no local. Novamente a neblina se dissipou e aí veio o sol, um calor intenso, e retornamos a jogar bola. Já era próximo de 11 horas da manhã, não me esqueço desde fatídico dia, que mudou minha vida. Quando retornamos a jogar eu comecei a sentir fortes dores em minhas articulações, mãos e especialmente pés. Joguei bola uns 10 minutos, e fui obrigado a parar porque a dor era intensa.
Disse aos colegas que eu não estava bem, estava com dores e iria pra minha residência. Para os amigos terem noção, o campinho próximo de minha casa, em caminhada dava em torno de cinco minutos, ficava literalmente na esquina da rua. Naquele dia, quando eu retornava, não conseguia caminhar de maneira normal, eu fui literalmente arrastando-me até chegar em minha casa.
Quando cheguei, comecei a chorar pra minha mãe porque eu não conseguia entender porque eu estava sentindo aquelas dores tão fortes, se eu não me machucará durante o jogo, não havia disputado nenhuma bola dividida, ou tenha sofrido alguma falta de um colega que pudesse ocasionar alguma lesão, nada, mas as dores eram horríveis.
Minha mãe dentro de suas condições passou álcool nas mãos e pés e acreditava que aquela dor seria passageira. Engano, não foi, chegou à noite, as articulações começaram a inchar, e criaram um tipo de calombo nas mãos, e quando se colocava a mão sobre o inchaço era muito quente, como se estivesse em febre. Devido às dores eu não consegui ir para o colégio, e passaram-se três dias, e as dores continuavam.
Minha mãe então disse ao meu pai que era preciso procurar um médico, porque o inchaço não era normal e a região afetada estava muito quente. Procuramos um médico, o qual hoje, já falecido, Dr. Henrique Ordovás Filho, que era pediatra. Ele me encaminhou para realização de alguns exames, que após resultado, me diagnosticaram com Artrite Reumatoide Juvenil, meu organismo fora atacado violentamente pela gota, reumatismo no sangue e ossos.
A partir daquele ano 1971, a minha vida mudava drasticamente. Como confortar um menino de 7 anos que era acostumado a passar o dia na rua brincando com colegas, de que ele não poderia mais brincar da mesma forma, porque a doença que ele tinha iria limitá-lo. E foi exatamente assim que ocorreu, eu vivia enclausurado porque as dores eram constantes e não davam trégua.
Foram inúmeras situações na busca de uma possível cura a doença, todas frustradas, benzeduras, chás, curandeirismo, e até promessas, e nada; a doença avançava impiedosamente, limitando minhas ações. Minha família, de pais operários e sem muitos recursos, faziam o que podiam dentro de suas possibilidades.
Eu faltava muito a escola, devido as dores, fazer certos exercícios na hora da educação física como outras crianças normais, era praticamente impossível, eu não conseguia, e não era porque eu não queria, mas meu corpo já estava me limitando muitas ações, e por conta disso, também sofria com as chacotas de outras crianças que zombavam por exemplo por eu não conseguir fazer flexões. Isto me incomodava, na época um menino, como saber lidar com isso.
Eu cada vez mais me enclausurava em minha residência. Não me sentia mais motivado para ir pra rua e brincar com outras crianças, porque a dor me importunava e para não ser mais motivo de chacotas, eu me trancava.
Além de minha doença, minha família teve uma perda irreparável no ano de 1975, meu pai faleceu prematuramente aos 41 anos. Deixando três filhos menores e a esposa. Minha mãe, guerreira e exemplo em minha vida, com a perda de meu pai, teve de ir a luta para buscar o sustento dos filhos. Trabalhou como doméstica até que fossem agilizados os papéis de pensionista que receberia, a burocracia a exemplo de hoje era excessiva.
Quando completei 12 anos, minha mãe me levou a um médico especialista, a um reumatologista. Este médico, um dia em uma consulta de rotina, ele começou a me alertar sobre as consequências desta doença sobre o meu corpo. Além da atrofia nas articulações, eu poderia sofrer outras sequelas ocasionadas pela artrite. Me disse com todas as palavras que eu poderia talvez próximo dos 30 anos, estar em uma cadeira de rodas, e que a estimativa de vida também poderia não ser longa, e que talvez viveria até os 40 anos de idade.
Este dia também me marcou, imaginem o que passa na cabeça de um menino de 12 anos. Eu simplesmente não conseguia vislumbrar um futuro. Cada vez mais trancado em minha casa.
Sabem quem era o meu melhor amigo naqueles momentos de solidão, meu cão de estimação, seu nome era “Toco”. Todo instante em que eu estava sozinho e chorando em minha solidão e questionando o porquê de eu estar passando por aquele martírio, ele estava ali do meu lado. Também senti muito quando de sua perda, mas aprendi o quanto ele me foi importante nestes momentos de tribulação.
A minha pior crise reumática e que quase me matou foi quando tinha entre 13 e 14 anos de idade. A crise foi tão forte que eu fiquei de cama por mais de uma semana, mal conseguia me mexer na cama. Minha mãe tadinha, sofreu muito ao me ver naquela situação, e eu também sofria pois me sentia incapacitado de poder ajudá-la naquele momento difícil.
Minha mãe saia para o trabalho por volta das 07 horas da manhã, deixava já o almoço pronto para os filhos, ela retornava volta das 18 horas, e depois trabalhava mais meio período na noite em uma clínica de fisioterapia como doméstica. Ela chegava em casa por volta das 23 horas.
Meu estado de saúde cada vez mais se agravando, e chegou um momento em que outra doença também me acometeu, a rubéola. Aí eu mesmo já não acreditava mais que teria solução.
Chegou um momento em que eu estava tão fraco, que já não conseguia mais me alimentar direito, tudo que eu ingeria era questão de poucos minutos e colocava tudo pra fora, nada parava em meu estômago, e as dores reumáticas incessantes.
Minha mãe muito preocupada, passava horas ao lado de minha cama em vigília por mim. Eis que em mais uma madrugada daquelas em que sentia fortes dores no corpo, acordei e com esforço tentava me virar para o outro lado, e senti uma mão em meu ombro, e me ajudou a virar. Era minha mãe, 2 horas da madrugada, ela estava ali, sentada em uma cadeira acordada para me auxiliar. Eu fiquei perplexo, e pedi que ela fosse dormir, pois eu sabia que ela teria de ir trabalhar às 7 horas. Ela levantou-se, perguntou se eu iria ficar bem e saiu do quarto.
A você que me acompanhou até aqui neste relato, não sei se irá acreditar no que eu irei relatar daqui pra frente, mas essa é a minha verdadeira história. Quando minha mãe saiu daquele quarto, comecei a chorar, e chorar muito, foi neste momento em que vendo o sofrimento de minha querida mãe, pedi a Deus que me ajudasse porque eu não queria morrer, precisava melhorar para ajudar minha mãezinha. Após uma semana, comecei a melhorar de fato, passei a me alimentar melhor, as dores diminuíram um pouco, consegui sair da cama e aos poucos retomar a minha vida e meus estudos.
Como já era um adolescente, um dia resolvi fazer um curso no Senac em Caxias do Sul, na época era um curso para escriturário de banco, esta função existia naquela época. Devido a doença da artrite eu não tinha muita opção de escolha para trabalho, pois eu era extremamente limitado para várias funções, e membros como mãos, pés, cotovelos, pescoço e joelhos já estavam bastante comprometidos. Foi neste curso que conheci uma jovem, ela já era adulta e trabalhava em uma emissora de rádio, e disse que eu tinha voz de locutor, e que deveria tentar fazer um teste.
Eu jamais pensei em tal possibilidade, mas esta moça durante umas três vezes insistiu que eu deveria tentar procurar uma rádio e fazer um teste para locutor. Como ela trabalhava na época na Rádio Difusora de Caxias do Sul, disse que daria uma força para que eu fizesse um teste. Bom, sem entender absolutamente nada de rádio, imagem, no primeiro teste fui reprovado.
Na outra semana no curso, ela voltou a insistir e que eu deveria fazer um teste em outra emissora. Pois bem, lá fui eu, franzino, raquítico, e era mesmo, fiz um novo teste na antiga Rádio Independência de Caxias do Sul. Por sorte, quem me atendeu foi o gerente da emissora, e me deixou fazer o teste. Ele gostou e me deu a primeira oportunidade, aprender a trabalhar primeiro como office boy, depois na secretaria, depois como operador de áudio e finalmente como locutor de rádio. E assim não parei mais.
Vejam bem meus amigos, hoje estou com 55 anos de idade, alguém que aos 12 anos receberá a informação do médico de que eu poderia aos 30 anos estar em uma cadeira de rodas, mas não estou; o mesmo médico que disse que eu teria como probabilidade de vida até os 40 anos, mas estou com 55 anos e continuo vivo.
Casei, formei uma família, três filhos, dois netos, e prestes a se aposentar, assim espero.
Minha doença, sim, continua me impondo limitações, mas ela de alguma forma passou a evoluir de uma forma mais lenta, deixou estragos sim, atrofia de mãos e pés especialmente. Mas sou grato a DEUS, pois se a doença me tirou a capacidade de tantas outras tarefas para poder levar uma vida com dignidade como todo ser humano merece ter, DEUS me deu o dom da voz para que com ela eu me tornasse um profissional da voz, e pudesse viver, construir família, e garantir meu espaço na sociedade com dignidade.
Por isso sei da dor e das limitações de quem tem reumatismo, eu convivo com esta doença por 46 anos. Minha fé em DEUS me fortaleceu no momento mais difícil de minha vida, lá na adolescência, mas estou de pé e surpreendendo tantos quando digo que tenho esta doença desde os meus 7 anos de idade.
Não podemos desistir, podemos sim nos adaptar a algumas situações, mas desistir não, e especialmente nunca desista dele, DEUS, ele está com você em todos os momentos.
Hoje a tecnologia avançou tanto que existem centenas de alternativas para tratamento, bem diferente em minha época, quando a doença se manifestou. Espero de alguma forma ter contribuído com meus irmãos reumáticos, e que sofrem, já sofreram, e vão continuar sentindo as dores incuráveis do reumatismo, mas nosso amor pela vida, é muito maior, e por ela, pela sua família, vale a pena viver. Abraço, e paz!
“Dor Compartilhada é Dor Diminuída”, entenda que ao escrever praticamos uma autoterapia e sua história pode ajudar alguém a viver melhor com a doença!
É simples, preencha o formulário no link http://ow.ly/gGra50nFGJp
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