No biobanco do Instituto de Medicina Molecular (IMM) de Lisboa, que guarda milhares de amostras de sangue, soro ou tumores para investigação, as doenças ‘ganham’ cores, as das tampas dos tubinhos que as ‘conservam’ congeladas em potes a fumegar.
Passando uma porta, logo à entrada, Fabiana Rodrigues, técnica responsável pela gestão de pedidos de amostras, extrai com uma pipeta porções de soro recolhidas de doentes com artrite reumatoide, uma doença autoimune e uma das várias patologias crónicas representadas no biobanco.
O pedido de amostras de soro de doentes com artrite reumatoide chegou de um investigador que, como noutras situações, pretende testar um medicamento ou pesquisar novos biomarcadores da doença.
Por trás de Fabiana Rodrigues, em cima de prateleiras, dispõem-se frascos com as tampas coloridas de pequenos tubos de plástico que hão de receber as novas amostras que chegarem ao biobanco.
Ângela Afonso, uma outra técnica, que faz a gestão da base de dados, explica que, para facilitar o trabalho, as diferentes doenças, às quais estão associadas as amostras, são identificadas pela cor das tampas dos tubinhos.
O laranja é para os canceres, o verde para os acidentes vasculares cerebrais e outras doenças neurológicas, o castanho para as pulmonares, o azul para as relacionadas com o movimento, o rosa para as patologias do sangue, o preto para as do aparelho gástrico, o roxo e o vermelho para as reumáticas. Há ainda as tampas amarelas para as amostras de material biológico de crianças e as transparentes para as amostras de doadores saudáveis.
Ao todo, o biobanco do IMM reúne cerca de 167 mil amostras biológicas – sangue e soro, em maior número, osso, tecidos tumorais, ADN, saliva e líquido de cartilagens – doadas por quase 16 mil pessoas, a maioria doentes.
No caso das amostras dos doentes, o principal fornecedor do biobanco, pela sua localização próxima, é o Hospital de Santa Maria, que, com o Instituto de Medicina Molecular, a Faculdade de Medicina e o Hospital Pulido Valente, forma o Centro Académico de Medicina de Lisboa.
A colheita das amostras de controle de pessoas saudáveis, tem sido feita na própria faculdade, em associações e empresas.
A próxima campanha de recolha decorrerá em 30 e 31 de outubro, por iniciativa do Fundo IMM-Laço, destinado à investigação sobre o câncer de mama, e que desafia os cidadãos, de boa saúde ou não, a darem sangue no instituto.
No biobanco, que a equipa técnica arrisca a dizer que é único em Portugal, dada a diversidade de amostras de material biológico disponíveis, as coleções distribuem-se, num minúsculo compartimento, por quatro arcas congeladoras e dois potes com azoto líquido, que, quando abertos, fumegam.
Nas arcas conservam-se a 80 graus negativos amostras mais recentes, até cinco anos. Numa delas estão 48.000 tubinhos e numa outra 60.000, conta a técnica Ângela Afonso, depois de abrir, com duas grandes luvas azuis calçadas, uma das arcas.
Lá dentro, depois de aberta uma das gavetas, não se vislumbra quase nada devido ao gelo, a não ser as cores das tampas dos tubinhos, arrumados em caixas.
Nos potes, as amostras, que são retiradas dos recipientes com uma pega fininha, são preservadas a 196 graus negativos e por mais tempo. No pote mais pequeno estão 3.500 e no maior 6.000, precisa Ângela Afonso.
Para saberem exatamente em que parte das caixas e em que sítio da arca ou do pote estão os tubos com as amostras pretendidas, os técnicos do biobanco socorrem-se de um ‘software’ informativo, o mesmo que dá um código a cada amostra, para salvaguardar a identidade do dador, e o associa à informação clínica da pessoa.
Regularmente, são feitos testes de qualidade às amostras para verificar o estado das proteínas ou do ADN, esclarece um dos codiretores do biobanco, Sérgio Dias.
São sobretudo cientistas que trabalham em Portugal quem mais procura os serviços do biobanco. Mas já tem havido solicitações da Alemanha, Espanha, França e dos países nórdicos, adiantou, acrescentando que os pedidos de amostras (que são pagas) são avaliados por uma comissão ética e científica tendo em conta a pertinência da investigação.
O biobanco não é um mero armazém, segundo Sérgio Dias. Pretende estar à disposição dos cientistas, pelo que a ideia é ter “o maior número possível de coleções atraentes para os investigadores fazerem perguntas”, sublinhou.
Além de reunir coleções de material biológico, com as quais é possível acompanhar a evolução da doença de um dador, o biobanco do Instituto de Medicina Molecular isola células do sangue e de tumores e cultiva, a partir de biópsias de pele, fibroblastos, células que têm a capacidade de se diferenciarem noutras, como as de tecido muscular, ósseo, cartilaginoso e adiposo, sendo por isso importantes para a regeneração de órgãos.
Em marcha está a possibilidade de o biobanco vir a recolher e guardar cérebros, peças de estudo preciosas para os neurocientistas.
Sérgio Dias gostava que o serviço que dirige tivesse também equipamentos para conservar amostras de fezes, essenciais para estudar o microbioma (a população de microrganismos, como as bactérias, que vive no intestino).
Mas, para tal, assinalou, serão necessárias instalações mais amplas do que as atuais, que, ao contrário das tampas dos tubinhos com as amostras, são praticamente monocromáticas.
Reportagem de Elsa Resende (texto) e André Kosters (fotos), da agência Lusa
Fonte: http://24.sapo.pt/atualidade/artigos/no-biobanco-as-doencas-tem-as-cores-do-arco-iris
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