Qual a origem ou a história do termo LER/DORT?
Incontáveis casos identificados como LER/ DORT em um passado recente resultaram na polêmica “epidemia de LER/DORT” no nosso país. LER/DORT não é um diagnóstico etiológico, mas apenas uma denominação genérica.
Trata-se de uma sigla cunhada na época sem grande embasamento científico. A simplicidade do seu significado, atualmente questionada pela medicina moderna, facilitou seu uso disseminado, permitindo uma simplificação inadequada da interpretação dos casos.
Na década de 80, trabalhadores submetidos a intensas jornadas de trabalho, muitas associadas à baixa remuneração, ergonomia inapropriada e ao estresse, passaram a apresentar vários sintomas heterogêneos que resultaram em ações trabalhistas.
Na ausência dos conhecimentos médicos atuais, esse grupo de sintomas foi reunido em uma sigla arbitrária (LER, e depois, DORT) quando, de fato, representavam muitas doenças, com causas, mecanismos e tratamentos diferentes.
O desconhecimento que marcou esse período atribuiu, equivocadamente, a causa de todas essas doenças às repetições de movimentos no contexto do trabalho. Esse equívoco foi facilitado pelo fato de a maioria dos trabalhadores em litígio trabalhista serem provenientes da indústria, que produz em série.
Não havendo uma descrição técnica do que era, realmente, LER/DORT, os próprios trabalhadores afetados permaneciam sem tratamentos específicos, corroborando a falsa ideia de incapacidade permanente para esse grupo de doenças, as quais dispõem de tratamentos.
Afastados do trabalho e do tratamento, os indivíduos afetados criavam precedentes jurídicos para o embasamento de uma avalanche de ações trabalhistas, maior disseminação do uso da arbitrária sigla LER/DORT e aprofundamento do desconhecimento sobre suas causas e terapêuticas. Esse círculo vicioso prejudicou a Justiça, os trabalhadores e a sociedade, retardando esforços para a maior compreensão das doenças envolvidas, em especial no meio jurídico.
Há novas descobertas que possam mudar a interpretação atual de LER/DORT?
Alguns trabalhos científicos e análises de especialistas passaram a evidenciar a associação de muitos casos de LER/DORT com fatores sociais, familiares, econômicos e com o estresse ou a insatisfação no trabalho, inclusive de casos de lombalgia e outras dores nas costas. Isso explicava porque muitos, mesmo não envolvidos na execução de trabalhos repetitivos, apresentavam sintomas similares.
O chamado modelo biopsicossocial passou a ser mais aceito na comunidade científica envolvida com esses problemas musculoesqueléticos e de dor crônica mal esclarecida. Os fatores mecânicos (repetição, força, posturas) continuavam presentes, mas tiveram sua importância reduzida frente a outros fatores tão ou mais importantes (insatisfação no trabalho, depressão, ansiedade ou problemas pessoais, por exemplo).
O modelo biopsicossocial explicava melhor as características comuns desse grupo de pacientes, inclusive sua característica litigante frequente. Passou-se a demonstrar que LER/DORT se referia a várias doenças diferentes, sem relação com o trabalho, enfatizando-se que deviam ser devidamente identificadas, individualizadas e tratadas.
Algumas delas ocorrem com maior frequência. Há estudos demonstrando que um grande número delas pode ter relação com a depressão ou com a ansiedade, como a fibromialgia e a síndrome miofascial, contabilizando em torno de 60%-70% de diagnósticos equivocados e incluídos como LER/DORT. Isso corrobora tanto a adequação do modelo biopsicossocial quanto a crescente impropriedade do uso de uma sigla única.
Há opiniões ou evidências contrárias ao uso rotineiro do termo LER/DORT?
Vários tribunais estrangeiros passaram a atualizar seus conceitos e valorizar as novas evidências científicas. Tribunais da Austrália, Reino Unido e de vários Estados norte-americanos deixaram de reconhecer oficialmente os quadros denominados de LER/DORT, exigindo a identificação da real doença do litigante.
O termo LER/DORT também é considerado inapropriado por entidades médicas oficiais. O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP), por meio do Parecer n.º 76034, oficializou a opinião de que “É incorreto considerarse LER como entidade mórbida bem definida”. O CREMESP considera o termo polêmico (“LER ainda hoje é um tema polêmico”) e admite oficialmente que as morbidades relacionadas com o termo LER/ DORT sofrem forte influência de “fatores sociais, culturais, disputas trabalhistas”.
Qual a importância do diagnóstico correto para os pacientes e para a sociedade?
Com a evolução da medicina e com a incorporação de novas descobertas e novos conceitos, o antes tão debatido termo LER/DORT passa a enfraquecer frente às evidências científicas, dando lugar à interpretação individual de cada caso e sua classificação, segundo doenças que atualmente são melhor conhecidas e estudadas.
Recomenda-se que doenças antes agrupadas em uma única sigla LER/DORT sejam melhor identificadas, analisadas e tratadas, o que inclui como exemplos as tendinites, a síndrome do túnel do carpo, as síndromes miofasciais, a fibromialgia, as cervicalgias, cervicobraquialgias, lombalgias, lombociatalgias e quaisquer outras que antes eram agrupadas sob aquela sigla.
O forte impacto cultivado em torno da sigla LER/DORT ao longo de toda a sua história impede sua erradicação instantânea seja no meio médico seja no jurídico, mas não é impedimento para uma lenta e necessária interpretação mais detalhada dos fatos e doenças que ela envolve, em prol da adequação científica da interpretação pericial, de uma Justiça atualizada e do melhor tratamento e da recuperação dos trabalhadores afetados.
LER é uma doença?
Não, LER não corresponde a uma doença ou enfermidade. LER é a sigla para “Lesões por Esforços Repetitivos” e representa um grupo de afecções do sistema musculoesquelético. São diversas afecções que apresentam manifestações clínicas distintas e que variam em intensidade.
Porque a sigla DORT?
Representa a sigla para “Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho” e foi introduzida para substituir a sigla LER, particularmente por duas razões: primeiro porque a maioria dos trabalhadores com sintomas no sistema musculoesquelético não apresenta evidência de lesão em qualquer estrutura; a outra razão é que além do esforço repetitivo (sobrecarga dinâmica), outros tipos de sobrecargas no trabalho podem ser nocivas para o trabalhador como sobrecarga estática (uso de contração muscular por períodos prolongados para manutenção de postura); excesso de força empregada para execução de tarefas; uso de instrumentos que transmitam vibração excessiva; trabalhos executados com posturas inadequadas.
Atualmente, sabe-se que, além dos fatores mecânicos, também estão envolvidos fatores sociais, familiares, econômicos, bem como graus de insatisfação no trabalho, depressão, ansiedade, problemas pessoais ou outros, tornando altamente questionável o diagnóstico de LER ou DORT em muitos trabalhadores.
Quais são os distúrbios mais comuns?
Os distúrbios osteomusculares ocupacionais mais frequentes são as tendinites (particularmente do ombro, cotovelo e punho), as lombalgias (dores na região lombar) e as mialgias (dores musculares) em diversos locais do corpo.
Como se adquire um distúrbio osteomuscular relacionado ao trabalho?
Quando um ou mais dos seguintes fatores organizacionais no ambiente de trabalho não são respeitados:
- Treinamento e condicionamento (técnicas para execução de tarefas);
- Local de trabalho adequado (piso, superfície, barulho, umidade, ventilação;
- temperatura, iluminação, distanciamentos, angulações, etc);
- Ferramentas, utensílios, acessórios e mobiliários adequados;
- Duração das jornadas de trabalho
- Intervalos apropriados;
- Posturas adequadas;
- Respeito aos limites biomecânicos (força, repetitividade, manutenção de posturas específicas por períodos prolongados.
Portanto, um ambiente de trabalho organizado reduz muito a possibilidade de um indivíduo desencadear um distúrbio musculoesquelético. Convém ressaltar que existem predisposições individuais que aumentam a possibilidade de um trabalhador desenvolver DORT. Diversas variações congênitas do aparelho locomotor, enfermidades associadas, estresse, distúrbios psicológicos, estilo de vida, entre outros fatores, podem todos contribuir para o aparecimento desses distúrbios.
Quais são os trabalhadores mais vulneráveis?
Qualquer tipo de trabalho mal executado ou que não respeita os limites biomecânicos, juntamente com a predisposição constitucional da pessoa, pode desencadear DORT.
O trabalhador com dor ou outro sintoma é portador de LER ou DORT?
Não, necessariamente. Sintomas como dor, dormência, formigamento, sensação de pontadas ou agulhadas, diminuição da força, sensação de peso ou cansaço nos membros, inchaço, dificuldade de movimentação, desconforto, entre outros, podem ser decorrentes de diversas condições não relacionadas às sobrecargas biomecânicas no ambiente de trabalho.
Muitos distúrbios reumáticos, imunológicos, hormonais, metabólicos, ortopédicos, neurológicos ou infecciosos podem ser responsáveis por sintomas que simulam um distúrbio osteomuscular relacionado ao trabalho. Portanto, faz-se extremamente importante procurar o médico para a realização de diagnóstico preciso e de adequada estratégia terapêutica.
Esses distúrbios são incapacitantes?
É muito importante desmistificar o prognóstico dessas enfermidades. Ao contrário do que alguns declaram, todos esses distúrbios têm tratamento e, felizmente, os casos mais graves ou que não respondem ao tratamento clínico, podem ser beneficiados por procedimentos cirúrgicos e reabilitação específica.
Como é o tratamento desses distúrbios?
O tratamento depende sempre do diagnóstico preciso, de corrigir as causas no ambiente de trabalho e de instituir um plano terapêutico adequado. Diversas são as modalidades terapêuticas: fisioterapia (eletroterapia e cinesioterapia), medicamentos, infiltrações, órteses (acessórios para fins terapêuticos tais como talas, protetores, cintas, coletes, etc) e reabilitação.
O estresse psicológico influencia os sintomas?
Sim. Qualquer forma de estresse psicológico pode influenciar diretamente na percepção da dor ou de outros sintomas. A ansiedade, a depressão e outros distúrbios psicológicos podem também gerar ou agravar a tensão muscular (a qual causa contração e dor no músculo).
Em muitos casos, a insatisfação com o trabalho, ou outro componente emocional, tem sido a principal responsável pela perpetuação da sintomatologia. A boa relação médico-paciente, a satisfação com a vida, a motivação pelo trabalho e as convicções do indivíduo são ingredientes essenciais para o sucesso terapêutico.
Como prevenir os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho?
Criando-se um bom ambiente de trabalho e respeitando-se os limites de cada indivíduo. A prevenção deve ser iniciada com a seleção adequada dos operários, aprendizagem de técnicas, condicionamento e ensinamento de posturas apropriadas. A duração das jornadas de trabalho deve ser respeitada, assim como a presença de intervalos periódicos.
Todos os instrumentos, ferramentas, acessórios, mobiliários e postos de trabalho devem ser convenientes, como também as posições, distâncias e angulações envolvidas. Tudo isso somado a um adequado estilo de vida, com boa qualidade do sono, condicionamento físico e manutenção da saúde geral, proporcionará a qualquer trabalhador condições de executar suas tarefas laborativas com os mínimos riscos de desenvolver um distúrbio osteomuscular.
- Confira todas as informações no website: Sociedade Brasileira de Reumatologia baixe a cartilha gratuitamente online, para leitura no celular, tablet ou computador.
FONTE: Sociedade Brasileira de Reumatologia
CartilhaSBR-Ler-Dort (1)Descubra mais sobre Artrite Reumatoide
Assine para receber nossas notícias mais recentes por e-mail.