A fábrica é resultado de uma parceria fechada em 2013 entre o Butantan e um laboratório particular. O Ministério da Saúde, que foi o avalista do acordo, deveria dar o sinal para que a produção começasse, mas não se manifestou. E o laboratório desistiu do negócio.
Uma fábrica de remédios de alto custo para câncer e doenças autoimunes está parada em São Paulo. Segundo o Instituto Butantan, por falta de ação do Ministério da Saúde.
A construção de um prédio era uma das últimas etapas de um projeto estratégico: transformar o Instituto Butantan, pioneiro na produção de soros e vacinas do país, no primeiro laboratório público capaz de fabricar anticorpos monoclonais no Brasil.
Esses remédios, que imitam a capacidade de proteção do sistema imune, vêm revolucionando a medicina. São o que existe de mais avançado, hoje, no tratamento de câncer e de doenças autoimunes, como artrite reumatóide e psoríase.
A oncologista Rachel Riechelmann explica que os anticorpos monoclonais são mais eficazes e menos agressivos do que as terapias convencionais.
“Eles são desenvolvidos especificamente para atuar em alterações moleculares do câncer, diferente da quimioterapia, que age em todas as células do organismo. Prolonga a vida das pessoas, controla melhor a doença, melhora a qualidade de vida, reduzindo tumor, reduzindo dor, com um bom perfil de efeitos colaterais”, diz.
Para viabilizar o projeto, o Butantan aderiu a um programa do Ministério da Saúde conhecido pela sigla PDP – Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo.
Funciona assim: um laboratório público procura um fabricante privado que produza medicamentos considerados estratégicos pelo SUS e faz um acordo: a empresa ensina a tecnologia para a fabricação e, em troca, vende a produção para o poder público.
O Ministério da Saúde entra como uma espécie de fiador, garantindo a compra do produto durante a transferência de tecnologia, que pode chegar a 10 anos. Uma iniciativa que traz conhecimento e dinheiro para o país, como explica o presidente da Associação dos Laboratórios Oficiais do Brasil, Arthur Roberto Couto.
“Todo frasco, toda rolha, toda tampa das caixas, a contratação de mão de obra, tudo isso é feito no Brasil, que gera impostos para o governo federal e estadual. Ela tem uma importância significativa, não só o preço, que você consegue com a transferência diminuir esse preço do produto, mas também impacta na cadeia produtiva”, afirma.
Para esse projeto, o Ministério da Saúde aprovou a parceria entre o Butantan e a farmacêutica Libbs em 2013. O acordo previa o desenvolvimento e a fabricação de seis medicamentos de alto custo: três contra o câncer, dois para doenças autoimunes e mais um usado para prevenir infecções causadas por um vírus respiratório.
A fábrica ficou pronta no meio de 2020. Até funcionários chegaram a ser contratados, mas não tem ninguém trabalhando lá. Até hoje, o Butantan não conseguiu produzir nenhum medicamento.
Salas com proteção biológica, equipamentos de última geração. Um investimento de R$ 120 milhões que está parado.
O gerente de Parcerias do Butantan, Tiago Rocca, diz que o laboratório privado desistiu do acordo depois de mais de um ano de espera pelo Ministério da Saúde dar sinal verde para a aquisição dos remédios que seriam produzidos no local.
“Foi muito em função da inoperância do próprio programa, ou seja: produtos que já estavam registrados aqui no Brasil, que já estavam aptos para serem fornecidos e a questão de contratos, de fornecimento, isso acabava não evoluindo ou não tendo volumes adequados para fornecimento. E isso acabou frustrando a expectativa principalmente do parceiro”, conta.
Em nota, o laboratório Libbs afirma que o investimento na fábrica do Butantan estava condicionado a compras públicas de medicamentos que não se concretizaram, tornando o projeto inviável.
Enquanto isso, o Ministério da Saúde continua comprando esses remédios de fabricantes privados. Só com a compra de um deles, o governo desembolsou R$ 87 milhões nos últimos 18 meses.
“Se o Ministério da Saúde for apenas um ministério comprador, realmente nós estamos perdendo muito. Nós estamos apenas comprando produto, trazendo e não temos nada a agregar com o país”, diz Arthur Couto.
Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que o Libbs desistiu, por decisão própria, da parceria. Que ações de auditoria de órgãos de controle de governos anteriores impactaram nos prazos. E que aguarda a apresentação de proposta dos parceiros pelo Instituto Butantan.
O Instituto Butantan afirmou que já indicou um novo parceiro há seis meses.
Fonte: Jornal Nacional – g1
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