As dores são tão fortes que há dias em que, mesmo com fome, Silvana Martins Franco, 53, não tem forças para levantar do sofá e ir até a cozinha. Há nove meses, ela percorre hospitais e consultórios médicos do Rio em busca de alívio para as inflamações que atingem os joelhos, tornozelos, punhos e até o movimento dos dedos.
Tudo começou em fevereiro, quando encarou os primeiros sintomas da chikungunya: febre, olhos vermelhos e dores no corpo e nas articulações. Essas últimas, porém, não deram trégua, uma situação que a levou a parar o trabalho e quase toda a rotina que tinha.
Além das mortes, dados do INSS já mostram outro impacto da chikungunya no país: o afastamento de trabalhadores devido às fortes dores crônicas que provoca.
Neste ano, o órgão do Ministério de Desenvolvimento Social já registra ao menos 941 concessões de auxílio-doença devido à enfermidade. Em todo o ano de 2015, foram somente 22, segundo balanço obtido pela Folha.
O número, no entanto, pode abranger mais de um pedido por pessoa, uma vez que o benefício é concedido temporariamente e pode ser renovado, conforme avaliação da perícia médica. Do total de benefícios concedidos em 2016, 115 ainda estão ativos, segundo o INSS. O órgão não informou o total de solicitações.
Trata-se de um benefício previsto para segurados do INSS acometidos por doença ou acidente e incapazes de continuar o trabalho. O valor corresponde a 91% da média de 80% das contribuições ao INSS -se essa média for de R$ 2.000, por exemplo, o benefício será de R$ 1.820.
Microempreendedora, Silvana é uma das pessoas que hoje busca o auxílio por não suportar as dores. “Não consigo escrever nem segurar a caneta. Se assino, minha assinatura sai como a de uma pessoa semialfabetizada.”
Apesar do aumento nas concessões, os registros de auxílio-doença por chikungunya ainda são recentes -dados do INSS mostram maior avanço entre março e agosto, meses típicos de epidemia. Por vezes, o quadro também é confundido com outros problemas osteomusculares.
Reportagem da Folha deste domingo (20) mostrou que a chikungunya preocupa pelo aumento das mortes. Já são ao menos 156 mortes confirmadas neste ano, ante seis em 2015, um avanço de 2.500%.
DOR, DOR, DOR
Diagnosticada com chikungunya em setembro de 2014, quando a doença ainda tinha circulação confirmada em poucos municípios do país, Maria Jussara de Oliveira, 52, sente até hoje os impactos da doença. “Nunca mais fui a mesma pessoa”, relata a moradora de Riachão do Jacuípe, na Bahia.
No último ano, chegou a ficar até três meses afastada do trabalho como assistente social. Hoje, ainda há dias em que a “crise” ataca. Os ombros incham, os pulsos doem.
Para lidar com possível aumento no número de casos crônicos, o Ministério da Saúde planeja uma revisão nos protocolos clínicos da chikungunya. Dados da pasta mostram que a prevalência da “fase crônica” varia nos estudos já realizados, podendo chegar a metade dos pacientes.
Os principais fatores de risco são ter mais de 45 anos, problemas articulares preexistentes e maior intensidade das lesões na fase inicial dos sintomas. “É como se a chikungunya tivesse piorado um quadro ou um terreno que estava suscetível à chegada dessa complicação”, diz Rivaldo Venâncio, da Fiocruz.
O que é?
Uma doença infecciosa transmitida pelos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus. O nome, no idioma swahili, significa “aqueles que se dobram”, uma referência à posição curvada em que os pacientes ficavam devido às dores na primeira epidemia, em 1952, na Tanzânia.
Por que está se falando mais na doença agora?
Os registros de casos prováveis no país cresceram muito em 2016. Se há dois anos a chikungunya estava restrita a poucos municípios de pequeno e médio porte, agora já atinge quase metade das cidades, incluindo capitais.
Ela pode se espalhar mais no verão?
Sim, porque esse é o período em que há maior infestação de aedes, mas há diferenças dentro do país: nos locais onde já houve muitos casos, como no Nordeste, pode ocorrer uma trégua, uma vez que parte da população já foi infectada. Já em locais com menos casos, como o Sudeste, mais pessoas estão suscetíveis.
Quais as preocupações de governos e especialistas?
Como a chikungunya gera dores nas articulações que podem se estender por meses, a rede de saúde pode ficar sobrecarregada. O alto número de mortes relacionadas à doença também preocupa especialistas.
Por que o número de mortes pela doença tem crescido?
Evidências iniciais apontam que a maioria das mortes ocorreu em grupos mais vulneráveis, como idosos ou pessoas com doenças crônicas. Há casos, porém, de pacientes que não tinham registro de doenças associadas. Parte dos especialistas diz que as mortes eram esperadas, uma vez que já havia registros na literatura médica. Outros dizem que o número de ocorrências é alto demais.
O número de óbitos ainda pode ser maior?
Sim, uma vez que ainda há casos em investigação. Segundo o Ministério da Saúde, a maioria das mortes foi registrada entre fevereiro e abril, mas confirmadas apenas nos últimos meses, após exames.
Há subnotificação?
Possivelmente sim, uma vez que há pacientes que demoram para procurar a rede de saúde ou para receber o diagnóstico, ou cujos atendimentos não são notificados no sistema federal. Os casos também podem ser confundidos com dengue e zika, e vice-versa.
Quando o vírus chegou ao Brasil?
Os três primeiros casos importados foram identificados em 2010. Em 2014, houve os primeiros casos autóctones (transmissão local). Naquele ano, porém, a doença ainda ficou restrita a poucos locais do país, em especial à Bahia e ao Amapá, com maior avanço a partir do fim de 2015.
Como saber se estou com chikungunya?
Os principais sintomas são febre alta e repentina, acima de 38°C, dor de cabeça e nos músculos e, principalmente, nas articulações dos pés e das mãos. Para o diagnóstico, é fundamental procurar um médico.
Como é o tratamento?
Não há um tratamento específico. Em geral, os pacientes são tratados com remédios para a febre e anti-inflamatórios para as dores nas articulações, a depender dos casos.
Como evitar a doença?
Assim como dengue e zika, a principal forma de prevenção da chikungunya é eliminar os focos do mosquito transmissor. Outras medidas, como uso de repelentes, também são recomendadas.
Fonte: Resenha Web
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