Por que métodos como a acupuntura, a ioga e a meditação alteram o funcionamento do organismo e promovem benefícios cada vez mais valorizados nos tratamentos tradicionais
A procuradora de Justiça Maria Angela Gadelha de Souza, 57 anos, é uma das pacientes do recém-inaugurado Núcleo de Bem-estar e Terapias Integrativas da BP, Beneficência Portuguesa de São Paulo, o mais novo dos principais hospitais brasileiros a implantar um serviço que combina métodos como acupuntura, meditação, ioga e massagem em seu rol de recursos. No tratamento contra as metástases oriundas do câncer de pâncreas que teve diagnosticado em 2013, além de remédios tradicionais. Maria Angela recebeu a prescrição de sessões de acupuntura. “Elas aliviam a dor e me ajudam a ter tranquilidade”, afirma a paciente.
Além de ser usada contra o câncer, a medicina integrativa está incorporada ao tratamento de doenças cardiovasculares, reumatológicas (artrite reumatóide, por exemplo), ansiedade, depressão e dor crônica, entre outras. A adoção das técnicas por centros de referência do Ocidente demorou décadas para acontecer porque, durante anos, perduraram o antagonismo e desconfiança mútuas de um lado em relação ao outro. Os médicos não acreditavam em seus efeitos e os terapeutas rejeitavam os conceitos por trás da medicina ocidental. Por isso, a prática de coisas como a meditação ou a ioga era considerada alternativa. Ou seja, substituía, e não complementava.
Atração de opostos
A ciência apagou a distância e aproximou o que até então eram opostos. Foi construída uma sólida linha de pesquisas cujos objetivos são aferir e buscar explicações para os resultados das práticas. Os benefícios começaram a ficar evidentes em estudos conduzidos por instituições de renome mundiais. Um dos mais recentes, divulgado há um mês, foi produzido pela Harvard Medical School, dos EUA, uma das pioneiras na implantação de centros do gênero. Após analisarem 32 outras pesquisas, os cientistas concluíram que opções como a acupuntura e a meditação funcionam na melhora do estado clínico dos pacientes, e particularmente, no alívio da dor crônica. “A medicina integrativa reduz a necessidade de remédios”, escreveu Yuan-Chi Lin, um dos autores da revisão.
Ainda há muito o que descobrir sobre o tema, mas está claro que a conexão entre a mente e o corpo é mais forte do que se imaginava. Pensamentos, sensações, atitudes diante do estresse promovem alterações na forma de o organismo operar. “A cabeça cura o corpo de maneira bem eficiente”, afirma o médico Liaw Chao, um dos coordenadores do novo serviço da Beneficência Portuguesa .
A acupuntura é a técnica com maior evidência científica de benefícios. Há vários mecanismos fisiológicos que os explicam, mas o principal é seu impacto no cérebro. Está comprovado que a colocação das agulhas nos pontos certos equilibra o funcionamento de algumas áreas, como o sistema límbico, onde dor e emoções são processados. Por isso, além do efeito analgésico, o método auxilia no combate à ansiedade e à depressão e até na diminuição dos sintomas do autismo, como demonstrou investigação da Hong Kong Baptist University feita com crianças afetadas pela síndrome. Sintomas como dificuldade de interação social e elevada sensibilidade à luz e ao barulho foram atenuados com a técnica.
Meditação e ioga também causam modificações cerebrais positivas. “Os dois métodos focam nos mecanismos da consciência e reduzem o processamento de informações não essenciais”, explica Peter Hall, da Universidade de Waterloo, no Canadá. “As pessoas ficam aptas para escolher facilmente o que deve ser prioritário.” Isso dá ao cérebro mais energia, assegurando combustível para que funções como o raciocínio e a memória se aprimorem. “Práticas como essas, que trazem contato com a respiração, são muito efetivas”, diz o endocrinologista Filippo Pedrinola, da coordenação do núcleo da Beneficência Portuguesa. Concentrada nos objetivos que importam, a pessoa consegue resposta superior nos tratamentos.
A comprovação dos benefícios permite que os pacientes tenham acesso ao que realmente funciona, sem risco de serem seduzidos pelo charlatanismo. E torna menos problemático um assunto antes evitado nos consultórios. “Grande parte dos pacientes tinha vergonha de contar que usava as técnicas no tratamento”, afirma o oncologista Ricardo Caponero, coordenador do Centro de Medicina Integrativa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo. “Agora, a relação está mais transparente.”
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