Foi sancionada, com vetos, pelo Presidente da República a Lei nº 14.874, de 28 de maio de 2024, que trata sobre a pesquisa com seres humanos e institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos. O normativo, publicado no Diário Oficial da União desta quarta-feira (29), teve origem do Projeto de Lei 6007/2023, de autoria dos ex-senadores Ana Amélia, Waldemir Moka e Walter Pinheiro.
A Lei estabelece exigências éticas e científicas nas pesquisas, instâncias de revisão ética, proteção dos voluntários, e responsabilidade dos pesquisadores e patrocinadores. Além disso, cria regras para fabricação, uso, importação e exportação de bens ou produtos para esse tipo de pesquisa. Também estão previstas regras para o armazenamento e a utilização de dados e de material biológico humano.
Análise de Petições
O regulamento publicado estabelece um prazo de 90 dias úteis para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) avaliar as solicitações iniciais de ensaios clínicos com seres humanos, com o objetivo de obter o registro sanitário do produto em investigação. Se a agência não se pronunciar dentro desse período, após receber a solicitação inicial do ensaio clínico de forma regular, o desenvolvimento clínico pode ser iniciado, desde que todas as aprovações éticas necessárias estejam em vigor.
A lei estipula que a Anvisa pode pedir esclarecimentos e documentos adicionais apenas uma vez, o que resultará na suspensão do prazo de análise, sem interrupção permitida. Para tal situação, a norma determina a elaboração de um regulamento específico para cumprir os prazos e requisitos. Além disso, concede à agência a autorização para realizar inspeções de Boas Práticas Clínicas (BPCs) em centros de pesquisa clínica, patrocinadores e Organizações Responsáveis pelos Ensaios Clínicos (ORPCs), conforme regulamentação aplicável.
Análise ética da pesquisa
Quanto ao processo de análise ética da pesquisa, a lei estabelece o prazo de 30 dias para que os comitês analisem os protocolos de pesquisa submetidos a eles, com todas as informações necessárias, podendo solicitar documentos adicionais ao pesquisador. Além disso, determina que, quando a pesquisa for considerada de interesse estratégico para o Sistema Único de Saúde (SUS), conforme definido pelo Ministério da Saúde, ela terá prioridade na análise ética e seguirá procedimentos especiais, não podendo ultrapassar o prazo de 15 dias a partir da data de recebimento dos documentos da pesquisa.
Tratamento Pós-Ensaio Clínico
O normativo também garante a continuidade do tratamento pós-ensaio clínico. De acordo com a Lei, antes do início do ensaio clínico, o patrocinador e o pesquisador devem submeter ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) um plano de acesso pós-estudo, apresentando e justificando a necessidade, ou não, de fornecer gratuitamente o medicamento experimental após o término do ensaio clínico aos participantes que dele necessitarem.
Se for necessário fornecer o medicamento após o ensaio clínico, o regulamento estabelece que um programa de fornecimento seja elaborado. Já a análise da continuidade do tratamento considerará diversos fatores, como a gravidade da doença e seu impacto na vida do participante; a disponibilidade de alternativas terapêuticas adequadas na localidade do participante; se o medicamento experimental atende a uma necessidade clínica não atendida; e se os benefícios para o participante superam os riscos do uso do medicamento experimental.
O texto publicado prevê a interrupção do fornecimento gratuito do medicamento experimental no programa de fornecimento pós-estudo em algumas situações específicas. Isso inclui a decisão do próprio participante da pesquisa, ou no caso em que ele não possa expressar sua vontade de forma válida; a cura da doença ou a introdução de uma alternativa terapêutica adequada, documentada pelo pesquisador; a falta de benefício do uso contínuo do medicamento experimental, considerando a relação risco-benefício fora do contexto do ensaio clínico, ou evidências de novos riscos relacionados ao perfil de segurança do medicamento experimental, também documentado pelo pesquisador; a ocorrência de reações adversas que inviabilizem a continuidade do medicamento, mesmo que haja benefícios; a impossibilidade de obtenção ou fabricação do medicamento por questões técnicas ou de segurança, desde que o patrocinador forneça uma alternativa terapêutica equivalente ou melhor existente no mercado; o transcurso de cinco anos desde a disponibilidade comercial do medicamento experimental no país; ou a disponibilidade do medicamento experimental na rede pública de saúde.
Vetos
Foi vetado o artigo que definia que o fornecimento gratuito do medicamento experimental no programa de fornecimento pós-estudo poderia ser interrompido, mediante submissão de justificativa ao CEP, para apreciação, no transcurso do prazo de 5 anos, contado da disponibilidade comercial do medicamento experimental no País.
Em justificativa ao veto, foi informado que “atualmente, é assegurado a todos os participantes, no final do estudo, por parte do patrocinador, acesso gratuito e por tempo indeterminado a métodos profiláticos, diagnósticos e terapêuticos que se demonstraram eficazes”. Além disso, foi informado que “a interrupção da oferta do medicamento no período pós-estudo fere os direitos dos participantes de pesquisa e compromete o eventual desenvolvimento de pesquisas éticas baseadas em princípios de dignidade, da beneficência e da justiça”. Por isso, foi defendido que “o medicamento experimental deve continuar a ser fornecido, aos participantes de pesquisa, independentemente de sua disponibilidade comercial pela iniciativa privada.’
Outro dispositivo vetado foi o que pretendia garantir a comunicação ao Ministério Público sobre a participação de membro de grupo indígena em pesquisa. Ao justificar o veto, foi alegado que “ao prever que a participação de membro de grupo indígena em pesquisa deverá ser comunicada ao Ministério Público, fere o princípio da isonomia e aponta para possível situação de tutela estatal em relação aos povos indígenas, condição já superada pela legislação”.
E agora?
O veto será encaminhado para análise em sessão conjunta dos deputados e senadores no Congresso Nacional, que poderão rejeitar ou manter veto aposto.
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