O diagnóstico do lúpus mudou o cotidiano da aposentada Ana Maria Santana, da manicure Aline Lacerda e da estudante de Ciências Sociais Tatiane Lourenço. Atividades que fazem parte da rotina de muita gente são um desafio para as três paraibanas, como levantar cedo para trabalhar ou estudar, permanecer por horas em ambientes com ar-condicionado ou lâmpadas fluorescentes, andar na rua despreocupado com o sol ou aproveitar o dia na praia.
O lúpus é uma doença autoimune e crônica, que se caracteriza por atingir diversos órgãos e por alterações nas respostas imunológicas pela presença de anticorpos dirigidos contra proteínas do próprio organismo. O tratamento específico é feito no Serviço de Reumatologia do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW), em João Pessoa, onde Ana Maria, Aline e Tatiane são acompanhadas.
“Mudou muita coisa na minha rotina. É uma guerra para estudar, porque tem uns professores que entendem, outros que não e tem dias que você acorda com tantas dores que não consegue nem levantar. Para trabalhar deve ser a mesma coisa”, revela Tatiane.
A limitação causada pelas dores nos ossos e nas articulações também são lembradas pela aposentada Ana Maria Santana, que mora em Bayeux, município da Região Metropolitana de João Pessoa.
A dor é um dos sintomas da doença, que pode causar inflamações em qualquer parte do corpo, como explica a médica reumatologista, docente e coordenadora da disciplina de Reumatologia do Curso de Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Danielle Egypto. “O lúpus é uma doença que pode afetar qualquer órgão, mas, claro, existem aqueles mais afetados como a pele e as articulações. Mas os rins, o cérebro, o coração, os pulmões, os vasos qualquer outra estrutura pode ter um processo inflamatório gerado pelo próprio organismo que está perturbado, pois o sistema imunológico não está funcionando adequadamente”, diz.
Segundo Danielle, não se sabe exatamente o que causa essa desregulação e é por isso que não se fala em cura para doenças autoimunes. “Quando se souber o que foi que levou a toda essa perturbação, a gente corrige e o paciente fica curado, mas é um conjunto de coisas, a gente acaba tratando tudo que o paciente apresenta de manifestações”, explica.
Quem não entende acaba infleunciando para que a pessoa se torne mais doente ainda.
Falta de informação
Além das mudanças na rotina, elas também passaram a lidar com o preconceito gerado pela falta de informação e com dificuldades até para a realização de atividades simples, como tomar banho ou varrer a casa. “Por não conhecerem a doença, quando começa a cair o cabelo [da gente], manchar a pele, as pessoas já acham que é uma doença contagiosa e lúpus não contagia ninguém, só prejudica a pessoa mesma”, diz a manicure Aline Lacerda.
A estudante Tatiane Lourenço também destaca que esse preconceito atinge psicologicamente a pessoa que tem lúpus. “Você vai começando a se sentir rejeitada pela sociedade, começa a sentir uma inútil, o povo está com medo de mim como se eu fosse transmitir o mal do século e não é bem assim. Quem não entende acaba influenciando para que a pessoa se torna mais doente ainda”, completou a estudante Tatiane Lourenço.
Atendimento especializado
O ambulatório de lúpus do Serviço de Reumatologia do HULW atende uma média de 28 pacientes por dia, todas as terças e quintas-feiras, de acordo com as responsáveis pelo setor, as médicas Ana Karla Guedes e Danielle Egypto. O local começou a funcionar em 2005, sendo referência para o tratamento do lúpus em todo o estado da Paraíba desde então. Além do lúpus, pacientes com outras doenças autoimunes, como esclerose sistêmica, artrite reumatóide e espondilite anquilosante também recebem cuidados no serviço.
Antes de buscarem atendimento no ambulatório de lúpus do HU, Ana Maria Santana, Tatiane Lourenço e Aline Lacerda procuraram serviços médicos particulares e realizaram diversas consultas para chegarem ao diagnóstico do lúpus. A queda de cabelo e as lesões na pele afetaram as três. Além disso, as manifestações do lúpus e o tratamento provocam alterações no peso e na autoestima das mulheres.
Antes de chegar ao atendimento especializado, Ana Maria passou por outros dois serviços até chegar ao setor de dermatologia do HU, quando só então foi encaminhada para o ambulatório. “O meu Lúpus está controlado, mas é uma doença que pode desencadear outras coisas, como problemas do coração, diabetes, pressão alta”, conta a aposentada.
Anticorpos contra proteínas do corpo
De acordo com a especialista, uma pessoa com lúpus tem uma quebra da tolerância imunológica, uma desregulação no funcionamento desse sistema e aí começa a reconhecer proteínas do corpo, em órgãos como o coração, cérebro e rins, por exemplo, como estranhas. Assim, ele começa a produzir anticorpos contra si mesmo.
“Você produz substâncias contra os rins que vão se depositar lá e causar uma inflamação, você produz anticorpos contra as células do sangue, a pessoa começa a destruir as hemáceas e tem anemia, destruir as plaquetas e pode ter sangramentos. Começa a produzir substâncias contra as células do cérebro, que vão causar inflamação e aí você pode ter processos inflamatórios em qualquer parte do corpo”, explica a médica Danielle Egypto.
Ambulatório
O ambulatório de lúpus do HU atende pacientes de toda a Paraíba e, segundo a médica Danielle Egypto, a demanda é tanta que até pacientes do Pernambuco e do Rio Grande do Norte procuram tratamento na unidade.
Os pacientes com lúpus que recebem cuidados no serviço podem procurá-lo em qualquer dia da semana, caso tenham alguma intercorrência, mas as consultas são concentradas nas terças e quintas-feiras, visto que o serviço contempla outras doenças autoimunes. “O ambulatório não para, mesmo na greve, os atendimentos aos pacientes agendados é mantido”, disse.
Para receber acompanhamento médico no serviço do HU, a pessoa que já tem o diagnóstico de lúpus só precisa ir até o hospital, fazer o cartão de atendimento e marcar a consulta, o agendamento via Unidade de Saúde da Família (USF) só é necessário em alguns casos.
“Se o paciente é atendido em outro serviço público do estado ou do município de João Pessoa e o médico achar que ele tem lúpus, ele faz o encaminhamento para o ambulatório de lúpus do HU. Ao chegar aqui, se ele não tiver o cartão do hospital, faz na hora e já marca a consulta aqui mesmo, sem precisar esperar por um agendamento do PSF. Se o paciente já sabe que tem a doença e quer vir direto para o ambulatório, ele pode vir e é mais tranquilo”, garante Danielle.
Fonte: Folha do Sertão
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