Presidente da Sociedade Paulista de Reumatologia explica sobre como o novo coronavírus afeta os pacientes reumáticos
Em mais uma transmissão online com o objetivo de conscientizar e educar os pacientes, os representantes da Rede Paulista de Suporte aos Pacientes Reumáticos, Ana Lúcia Paduello, que é Conselheira Nacional de Saúde, Eduardo Tenório, do Superando Lúpus e Priscila Torres, do GrupAR/EncontrAR se reuniram virtualmente com o Dr. Marcelo Pinheiro, presidente da Sociedade Paulista de Reumatologia (SPR), e a Dra. Gecilmara Salviato Pileggi, reumatologista e coordenadora da Comissão de Doenças Endêmicas e Infecciosas da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR). O webinar “Coronavírus e os pacientes reumáticos: importância e segurança da manutenção do tratamento”, transmitido em 11 de novembro, está disponível no link: https://youtu.be/1OpwJvZe90M
Os médicos foram convidados para falar sobre como o coronavírus têm se manifestado nos pacientes reumáticos e como a adesão ao tratamento é importante neste período de pandemia. Como também abordaram a perspectiva de imunização para esses pacientes.
O Dr. Pinheiro iniciou sua participação na transmissão afirmando que em relação à Covid-19 o maior questionamento é se os pacientes reumáticos têm maior risco para a doença. Para responder isso, o médico explicou um pouco sobre o processo da doença. Segundo ele, a doença se divide em três fases principais.
- Na fase inicial, 80 a 85% dos pacientes podem ter sintomas inespecíficos, relacionados a alguma síndrome gripal, podendo apresentar perda de paladar e olfato. Esta fase dura de cinco a sete dias, com sintomas mais leves e é indicado o monitoramento dos sintomas, pois ainda não há um tratamento concreto e específico.
- A fase dois é a inflamatória, na qual há um aumento de substâncias que causam inflamação no sangue, podendo levar ao aumento na dificuldade de respirar, possibilidade de piora da febre e maior chance de trombose, principalmente a do tipo pulmonar.
- Já a terceira fase é a mais crítica, podendo o paciente precisar de ventilação mecânica. O profissional ressaltou que devido aos processos inflamatórios da Covid-19, os médicos tiveram receio no início da pandemia de a doença se apresentar de forma mais severa nos pacientes reumáticos. Porém, o que foi observado é que os medicamentos já utilizados por esses pacientes bloqueiam os processos inflamatórios com maior eficiência, podendo gerar um efeito protetor.
Inclusive, o reumatologista afirmou que alguns medicamentos biológicos estão sendo testados como opção de tratamento para minimizar os efeitos das formas graves da Covid-19.
Como o coronavírus afeta os pacientes reumáticos?
O presidente da Sociedade Paulista de Reumatologia apresentou dados sobre a Covid-19 em pacientes reumáticos, trazendo o panorama da artrite reumatoide, esclerose sistêmica, espondilite anquilosante, artrite psoriática, vasculites e fibromialgia.
O especialista explicou que um estudo da Itália mostrou que em geral quando um paciente reumático tem uma infecção, há piora na atividade da doença. Mas com a Covid-19 isso não acontece. “Isso é uma coisa que a gente tem aprendido. Por exemplo, eu tenho lúpus e eu pego a Covid-19, o lúpus em geral não piora. Eu tenho artrite reumatoide e pego a Covid-19, a artrite não piora. E assim é com todas as outras”, afirmou ele.
Dr. Pinheiro ainda destacou que o risco de hospitalização e morte para os pacientes reumáticos que são infectados pela Covid-19 é semelhante ao da população em geral. E que as pessoas com comorbidades como hipertensão, diabetes e obesidade apresentam maior risco que os pacientes reumáticos, de acordo com o estudo. Essas informações foram corroboradas por outro estudo realizado em Nova York, que apresentou conclusões similares quanto ao risco para pacientes reumáticos.
O reumatologista também compartilhou um estudo, realizado por força tarefa mundial que reúne 40 países, a Rheumatology Alliance. Neste estudo, em relação aos primeiros seis mil pacientes incluídos, cerca de 70% são mulheres, na faixa etária a partir de 65 anos, sendo que a maior parte tem artrite reumatoide e lúpus, embora outras doenças também tenham sido analisadas.
Os resultados mostraram que os pacientes que utilizavam medicamentos biológicos Anti-TNF tinham 60% menos chance de precisar de internação no caso de Covid-19. Esse estudo também avaliou o uso da hidroxicloroquina, porém esse medicamento não mostrou chance menor de internação para os pacientes que já faziam uso contínuo do mesmo.
Os resultados mais preocupantes foram em relação a pacientes em uso de corticoides com uma dose maior a 10 miligramas por dia. “Neste caso não é necessário abandonar o tratamento com o corticoide, porque a doença está em atividade. O pior cenário seria a atividade mais a infecção pela Covid-19. A retirada do remédio precisa ser feita, se for o caso, após a avaliação do médico responsável”, disse Dr. Marcelo Pinheiro.
Ainda sobre a hidroxicloroquina, o médico apresentou dados de uma pesquisa realizada em todo o Brasil que acompanhou dez mil pacientes que utilizavam o medicamento de forma crônica para tratar uma doença reumática. O objetivo foi avaliar se eles teriam uma chance menor de contrair infecção pela Covid-19. Os resultados mostraram que a hidroxicloroquina não gerou nenhuma proteção aos pacientes, pois a chance de infecção deles era similar a das pessoas que não utilizavam o medicamento.
Outra descoberta deste estudo foi que os pacientes que haviam sido imunizados recentemente com a vacina contra Influenza tinham menos chance de desenvolver Covid-19. E os pacientes em uso de corticoides apresentavam um maior risco de infecção pela Covid-19, embora de forma leve no primeiro momento.
O presidente da SPR compartilhou ainda o estudo ReumaCov, registrado pela SBR, no qual foi feita uma comparação entre pacientes reumáticos com e sem Covid-19. Neste estudo foram analisados cerca de 1200 pacientes em todo o país. O estudo concluiu que a taxa de letalidade entre quatro e oito semanas foi entre 8 e 9%, um pouco maior que a população geral, porém com uma diferença pequena. E que os fatores de risco estavam mais associados à idade, doenças renais e diabetes do que à doença reumática. O trabalho também concluiu que os pacientes que fazem uso de medicamentos biológicos Anti-TNF têm menor chance de desenvolver as formas mais graves da Covid-19.
Tratamentos interrompidos por medo da pandemia
O reumatologista afirmou que no início da pandemia, entre março e maio, houve um abandono do tratamento por volta de 40 a 50%, devido às dificuldades de acesso ao reumatologista. Porém, ele ressaltou que as redes sociais foram muito importantes neste período para manter a comunicação e levar informação aos pacientes. A SBR fez uma tarefa para atualizar seus perfis no Facebook e Instagram diariamente neste período.
Além disso, o especialista afirmou que no início da pandemia eram realizados muitos atendimentos online pela Sociedade Paulista de Reumatologia para dar apoio aos pacientes, principalmente psicológico. Já que muitos deles estavam com a doença controlada, porém com muito medo do novo coronavírus.
“O medo acho que foi a pior coisa que a gente sentiu. Eu sou humano, nós (médicos) somos humanos também. O medo existia entre a gente, porque fomos vimos vários médicos morrerem, tivemos muitas perdas. Eu tive nove pessoas próximas… Naquele momento, a gente estava vivendo a emoção junto com vocês (pacientes).Todos suscetíveis e vulneráveis”, afirmou.
O especialista reforçou que no primeiro momento da pandemia existiam muitas dúvidas, mas que nesse período os profissionais da saúde aprenderam muito sobre o coronavírus e sua forma de ação. Para ele, hoje o cenário é outro. “O que a gente tem de recado principal? Manter a medicação e procurar o reumatologista. Todos os ambulatórios e consultórios reabriram, mantendo o distanciamento, as máscaras e higiene das mãos. Todas as medidas de proteção de disseminação (do vírus) devem ser mantidas e a gente ainda não sabe por quanto tempo vamos precisar disso”.
Síndrome Pós-Covid-19: Os pacientes reumáticos são mais afetados?
Priscila Torres, do Grupo EncontrAR, tem artrite reumatoide e contraiu a Covid-19 no início da pandemia. E durante a transmissão ela apresentou seu relato sobre como foi lidar com a doença. “Eu me recordo de na minha primeira dor, procurar o meu reumatologista dizendo assim: ‘Acho que estou perdendo a remissão’. Porque era uma dor, uma fadiga que parecia a fadiga da artrite reumatoide. E naquele momento eu me auto diagnostiquei e falei para o meu reumato: ‘Eu acho que estou ficando com a AR em atividade, porque eu estou com dor muscular, dor de fadiga, um cansaço absurdo e dor de cabeça’. Na verdade, eu estava já com o coronavírus”
Priscila ainda ressaltou que já é conhecida a Síndrome Pós-Covid-19, na qual alguns pacientes permanecem apresentando sintomas mesmo após o período de infecção da doença já ter passado. Sobre o tema, Dr. Pinheiro afirmou que as principais descrições por parte dos pacientes reumáticos está relacionada à fadiga, insônia e dor de cabeça. Porém, essa síndrome é mais descrita em pacientes gerais do que nos pacientes reumáticos, segundo ele.
O especialista ainda acrescentou que existem manifestações de artrite, com dor e inchaço nas articulações especialmente nos membros inferiores, após a infecção por Covid-19 em pacientes que nunca haviam tido qualquer tipo de doença reumática. Os sintomas costumam durar cerca de quatro semanas nesses pacientes e o tratamento é feito com medicamentos regulares para dor.
Importância da vacinação regular para os pacientes reumáticos e a perspectiva de imunização contra o coronavírus
Para Ana Lúcia Paduello, do GrupAR, os dados do estudo apresentado pelo médico, que mostram que pacientes vacinados contra a Influenza tiveram melhores resultados em relação a Covid-19, reforçam a importância do trabalho feito pelas associações de pacientes ao incentivar a importância de todos manterem sua carteira de vacinação atualizada. “A vacina é importantíssima para nós, pacientes reumáticos. Acompanhar o calendário e manter a carteira de vacina sempre atualizada é um ganho para todos nós”, reforçou.
Já Eduardo Tenório, do Superando Lúpus, concordou com a colega e acrescentou que todos e não apenas os pacientes reumáticos precisam estar atentos à vacinação regular. “Seja no grupo de pacientes reumáticos como na população como um todo, a taxa de vacinação está muito baixa. Temos municípios com 1 a 10% de vacinação quando é previsto 90 a 95% dependendo da vacina. O governo tem feito várias ações e campanhas em estações de metrôs e trens, mas também as unidades básicas de saúde estão próximas, tentando nesse momento ajudar”, reforçou Tenório que é síndico de um condomínio onde vivem mais de 1000 pessoas onde foi feita uma parceria com a unidade básica de saúde mais próxima para vacinar os moradores e levar informações de campanhas como Outubro Rosa e Novembro Azul ao local.
Aproveitando o gancho, a coordenadora da Comissão de Doenças Endêmicas e Infecciosas da SBR, Dra. Gecilmara falou um pouco a respeito da expectativa de imunização contra o coronavírus para os pacientes reumáticos. Ressaltando que, neste primeiro momento, as vacinas em estudo e produção no Brasil e no mundo, não serão indicadas a este grupo de pessoas, já que nenhum desses estudos incluiu pessoas com doenças reumáticas para avaliar os efeitos nestes pacientes.
“São todas vacinas novas e normalmente qualquer estudo de medicamento novo ou vacina nova é primeiramente voltado para o público adulto, saudável. Neste caso da da Covid-19, o próximo passo que já está acontecendo em várias vacinas é estudar a população de risco para o vírus”, contou a médica.
A reumatologista ainda reforçou que os estudos para vacinação devem levar em conta que no caso dos pacientes reumáticos há graus diferentes de imunossupressão devido aos medicamentos utilizados, além do tipo da doença de base. Doenças mais sistêmicas como lúpus, esclerose múltipla são mais preocupantes em relação ao risco para a Covid-19. Para ela, ainda não existe uma total compreensão de tudo que o coronavírus pode causar e, por isso, estudos para vacinas na parte da população que já tem o sistema imune mais debilitado devem ser deixadas por último.
E para finalizar a transmissão, o Dr. Marcelo Pinheiro respondeu diversas perguntas enviadas pelos pacientes sobre retorno ao trabalho, atividades físicas e comparecimento às consultas.
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