Especialista apresenta dados sobre a relação do coronavírus com as doenças inflamatórias intestinais e compartilha diretrizes do tratamento no período da pandemia
Em mais uma transmissão online com o objetivo de conscientizar e garantir a aderência ao tratamento para pacientes com doenças imunomediadas durante a pandemia, Priscila Torres, do GrupAr/EncontrAR, se reuniu virtualmente com Alessandra Souza, da Farmale, Júlia Assim, da ALEMDII e com a Dra. Marta Machado, gastroenterologista e presidente da Associação Brasileira de Colite Ulcerativa e Doença de Chron (ABCD). O webinar “Coronavírus e os pacientes com doenças inflamatórias intestinais: a importância e segurança da manutenção do tratamento”, transmitido em 19 de novembro, está disponível no link: https://youtu.be/ztR1o2E0CSs
Abrindo a conversa, Priscila Torres apresentou o dado colhido, por meio de associações de pacientes, de que cerca de 30% dos pacientes com doenças imunomediadas abandonaram o tratamento durante o período da pandemia por medo de contrair a doença e também o receio de ser mais suscetível à complicações por Covid-19.
“Precisamos fortalecer a importância de nós pacientes estarem em tratamento, a aprendermos a viver essa nova vida, dentro desse novo cenário. Porque há 9 meses falávamos, ‘vamos viver uns dias com a Covid’. E agora nós não sabemos mais quantos dias isso vai demorar até que tenhamos a vacina. A única certeza que nós temos é que as doenças crônicas e imunomediadas precisam de tratamento. E esse tratamento tem de ser contínuo e a doença não tratada pode trazer complicações que vão além do risco de contrair o coronavírus”, afirmou a representante GrupAr/EncontrAR.
Para tranquilizar os pacientes com doenças inflamatórias intestinais (DII) que abandonaram o tratamento a retomarem os cuidados essenciais para o controle da doença e incentivar aos que os mantiveram a seguir com os cuidados, Dra. Marta apresentou durante sua participação dados de diversas pesquisas sobre a relação das DII e a Covid-19.
Conhecendo a perspectiva do paciente sobre a pandemia
A médica apresentou um questionário do EFCCA, grupo europeu de estudo de doenças inflamatórias intestinais, iniciado no fim de março para entender a visão dos pacientes. Ela disse ainda que a ABCD, a ALEMDII e a Farmale solicitaram aos pacientes que respondessem a esse questionário e que o Brasil ficou entre os sete primeiros países com mais respostas ao mesmo.
Os dados do questionário mostraram que a maioria dos participantes são mulheres, cerca de 78%, com idade média de 41 anos, 40% possuem crianças em casa e 18% convivem com idosos. Destes, 58% tem doença de Crohn e 40% retocolite, sendo 2007 o ano médio de diagnóstico.
“Resumidamente o que eram os sentimentos dos pacientes, de todo o mundo? Medo. Eles acreditavam na transmissão, achavam que era de pessoa a pessoa e achavam importantíssimos os cuidados. Mais de 80% utilizavam mais de duas máscaras, com luvas e álcool em gel. Todos estavam tomando todos os cuidados, mas tinham medo de causa de morte pelo coronavírus, o que é natural”, afirmou a especialista.
Esse questionário também revelou que cerca da metade dos pacientes afirmou que conseguiu se tranquilizar e obter informações adequadas sobre o comportamento do coronavírus, que atitudes tomar e o que evitar neste período de pandemia por meio das associações de pacientes. E apenas 6% dos pacientes obtiveram as informações pelos médicos.
Ainda segundo os dados da pesquisa, 57% demonstraram que um dos maiores incômodos com relação à pandemia é o isolamento social. Houve mudança no ritmo de vida, no qual 82% diminuíram as viagens e 87% tinham medo de viajar de avião. Além da preocupação com o impacto econômico da pandemia pelo coronavírus que 64% demonstraram.
Dos participantes da pesquisa, 75% tinham medo de ir à hospitais e tentaram evitar médicos que possuem consultórios nessas instituições, assim como os centros de infusões. Cerca de 60% dos pacientes relataram estresse, considerando-o um dos piores sintomas da pandemia. Por fim, 98% dos pacientes afirmaram que os médicos não recomendaram a interrupção dos medicamentos utilizados para controle da doença inflamatória intestinal.
Doenças inflamatórias intestinais e a relação com o novo coronavírus
A presidente da ABCD apresentou também um estudo referente às manifestações gastrointestinais da Covid-19, pois o vírus pode causar uma série de sintomas nos intestinos, como náusea, vômito, diarréia, dores abdominais e mal-estar. Sintomas estes muito comuns à população em geral e que para os pacientes de doenças inflamatórias intestinais podem ser indícios de uma crise.
Neste estudo, foram avaliados os pacientes com Covid-19 reagente e sintomas gastrointestinais. Os resultados mostraram que a infecção é prolongada quando há sintomas no aparelho digestivo, porém a taxa de admissão em UTI foi menor, assim como a mortalidade em decorrência de complicações da Covid-19.
Um outro estudo, realizado em um hospital de referência de doenças inflamatórias intestinais na Alemanha, analisou dois grupos. Sendo o primeiro com pessoas sem nenhum tipo de doença inflamatória intestinal e o segundo com pacientes com DII. Os pacientes do segundo grupo apresentaram o triplo de medo de coronavírus do que o primeiro grupo.
Outro dado deste estudo mostrou que o grupo dos pacientes com doenças inflamatórias intestinais triplicou os cuidados de higiene, enquanto o outro grupo já demonstrava querer não usar a máscara e não mantinha o hábito de higienização das mãos com álcool gel. O grupo dos pacientes com doenças inflamatórias intestinais também apresentou alta adesão ao tratamento, com 96,4% dos pacientes. E 90% deles buscavam informação sobre a doença pela televisão, internet e grupos de pacientes. Enquanto apenas 10% procuraram a equipe médica.
A especialista também compartilhou um editorial de um profissional português, no qual se afirma que no momento não existem dados suficientes para reconhecer o papel do coronavírus na agudização da doença pré-existente. Para a Dra. Marta, ainda serão necessários a realização de mais estudos para avaliar essa influência.
A profissional ainda apresentou imagens que mostram que o coronavírus gera quadros de embolia dos vasos do intestino e também úlceras, independentemente de o paciente ter ou não uma doença inflamatória intestinal, podendo induzir a uma Colite.
Recomendações e diretrizes no tratamento das doenças inflamatórias intestinais na pandemia
Dra. Marta compartilhou durante sua apresentação quais foram as recomendações e diretrizes para o manejo dos procedimentos e medicações em pacientes com doenças inflamatórias intestinais durante a pandemia da Covid-19. Essas resoluções foram publicadas em revistas e associações internacionais, assim como no site do Grupo de Estudos de Doença Inflamatória Intestinal (GEDIIB).
Em relação às endoscopias apenas são recomendadas em casos de urgência ou quando haja dependência do exame para realizar alguma modificação no tratamento do paciente. Também é recomendado evitar o uso de corticóides ou pelo menos diminuir a dose de forma gradual. Já as terapias anti-TNF podem ser mantidas ou iniciadas, de preferência em monoterapia. Nos casos de tratamento por comboterapia, com anti-TNF e imunossupressor, a recomendação é suspender o último se a doença estiver controlada e evitar iniciar o tratamento desta forma. A profissional ainda ressaltou que essas condutas precisam ser avaliadas caso a caso, em conversa direta com o médico responsável pelo tratamento.
A presidente da ABCD ainda apresentou o posicionamento da Sociedade Americana de DII. Ela afirma que os pacientes com doenças inflamatórias intestinais, independentemente de utilizarem ou não imunossupressores, não parecem ter um risco aumentado de infecção pelo coronavírus. Entretanto pode haver risco extra de complicações pelo vírus se eles são infectados e estão utilizando imunossupressores.
Além disso, a continuidade do tratamento com imunomoduladores e terapia biológica é recomendada, com ressalva para os pacientes que precisam de internação, que precisam suspender os medicamentos. Para os pacientes que irão iniciar o tratamento com medicamentos biológicos é recomendado dar preferência a via subcutânea, para evitar visitas a clínicas ou hospitais.
E em caso de sintomas sugestivos da Covid-19, a sociedade americana recomenda que o paciente comunique imediatamente ao seu médico e realize o teste para detecção do novo coronavírus. Se o resultado for positivo, o profissional irá avaliar os medicamentos a serem suspensos durante o período de infecção.
Para finalizar, Dra. Marta reforçou a importância da manutenção dos cuidados para evitar a contaminação pela Covid-19. “A gente tem de se cuidar muito: sair de casa com máscara e usar álcool em gel. Se não precisar sair, fique em casa. Aproveite a sua casa, porque a única segurança de não se contaminar é mantendo o isolamento e tomando todos os cuidados. Acho que isso é uma responsabilidade de todos os cidadãos, e a gente vê que isso não está acontecendo”, disse ela.
A importância do autocuidado e de se manter bem informado
Sobre a questão do autocuidado, Júlia Assis, da ALEMDII, compartilhou sua experiência pessoal com a Covid-19. “Na minha família tivemos casos de Covid-19: minha irmã, cunhado, sobrinhos e minha mãe. Eu tive contato com todos eles e não peguei o vírus. Por quê? Porque mesmo estando em família eu tomava todos os cuidados: mantive distância, fiquei mais em ambientes abertos, usei álcool em gel… Além disso, até para ir a casa de alguém eu ficava em ambientes abertos. Não aceite ficar em espaços fechados que não fosse a minha casa”, disse ela.
Além do autocuidado, Alessandra Souza, da Farmale, também ressaltou a importância de confiar nas recomendações médicas, pois todos os médicos especialistas em doenças inflamatórias intestinais estão seguindo as mesmas diretrizes quanto aos tratamentos. . “Tem bastante artigo já publicado. Para quem gosta de ler e se informar mais, saiba que qualquer artigo relacionado à Covid-19 está aberto, isso foi uma regra desde que se instalou a pandemia. Então qualquer pessoa pode acessar e fazer a leitura”, informou Alessandra reforçando a importância dos pacientes estarem bem informados, lendo conteúdos científicos já publicados sobre a relação das DIIS com o coronavírus.
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