Enquanto 40% dos pacientes disseram que seu estado de saúde em geral era “um pouco pior” ou “muito pior” que no ano anterior, esse percentual foi de apenas 3,3% entre os demais participantes do estudo. A pesquisa detectou um índice alto de depressão nas pessoas diagnosticadas com artrite reumatoide: 63,33% delas apresentavam algum grau do problema, comparado a 13,34% do grupo de controle. “Os sintomas depressivos podem aparecer em decorrência das limitações físicas ocasionadas pelas deformidades ou do estresse de viver com uma doença crônica, devido à sua natureza potencialmente debilitante”, observa Cristiane Vitaliano Graminha, professora do Departamento de Fisioterapia Aplicada da UFTM e principal autora do estudo, publicado na revista Fisioterapia e Pesquisa.
Foi o que ocorreu com Priscila, hoje com 34 anos. À época do diagnóstico, ela tinha uma rotina intensa: trabalhava, cursava faculdade de enfermagem e cuidava do filho Tiago, que tinha 4 anos. “É um peso muito grande. Você sente que seu destino foi ameaçado, que está predestinada a sofrer e que não terá mais possibilidade de trabalhar, ser feliz, participar da vida. É a mensagem que chega com esse diagnóstico”, diz Priscila. “Achava que ia morrer. Fiquei muito depressiva, olhava para o meu filho e imaginava que, dali a 10 anos, ele estaria me empurrando em uma cadeira de rodas”, recorda a auxiliar de enfermagem.
Cristiane Vitalino Graminha afirma que, além do componente emocional, é possível que a depressão esteja associada à etiologia da doença. “Há evidências que apontam para influências biológicas na causa da depressão nesses indivíduos”, diz. De acordo com ela, alguns autores sugerem que a depressão é uma manifestação da própria disfunção imunológica característica da artrite reumatoide. Essa é uma enfermidade autoimune, quando as células de defesa acreditam que estruturas do corpo são agentes externos e passam a combatê-las. “A literatura aponta ainda que o uso de corticoides, um dos medicamentos administrados no tratamento, pode desencadear distúrbios psiquiátricos, entre eles, a depressão”, diz.
Diagnóstico estratégico
Não se vitimizar e superar os limites é a receita que a psicóloga Juliana Cavalin De Amo Freitas, de 31, segue à risca para enfrentar a doença. “No começo, é muito difícil. Mas, quando você aceita e entende as limitações, vai se adaptando. Se estou com dor na mão e preciso pegar alguma coisa, pego com o pé. Meu cotovelo não estica, tenho deformidade em um dedo… Mas corro atrás de tudo que posso fazer. Quando não dá, paciência. Temos que ter humildade para reconhecer e pedir ajuda quando precisar”, diz ela, que possui duas próteses nos joelhos.
Juliana foi diagnosticada aos 10 anos com artrite idiopática juvenil (AIJ) poliarticular, quando mais de quatro articulações são afetadas. A enfermidade não entrou em remissão e ainda hoje ela faz tratamento. Na idade adulta, a AIJ comporta-se da mesma forma que a artrite reumatoide inicial, tanto do ponto de vista clínico quanto imunológico. O metotrexato, medicamento modificador da evolução da doença mais utilizado pelos pacientes, provoca efeitos colaterais fortes em Juliana, que eventualmente recorre ao corticoide para diminuir as dores. Contudo, ela não se deixa abalar. Trabalha normalmente e, ainda este ano, pretende engravidar do primeiro filho. “Estou me preparando física e psicologicamente”, garante. A artrite reumatoide não tem impacto negativo sobre a fertilidade, mas, como alguns medicamentos podem prejudicar o feto, o reumatologista precisa estar ciente dos planos de gestação.
Vida sexual comprometida
A reumatologista Licia Mota, responsável pelo Ambulatório de Artrite Reumatoide Inicial do Hospital Universitário de Brasília (HUB), conta que, certa vez, três pacientes comentaram que estavam com a vida sexual muito comprometida e questionaram se isso poderia estar relacionado à doença. “Nas reuniões com eles, esse tema é tabu. Ficam envergonhados, e os médicos, mais ainda. Os profissionais não têm preparo sobre um domínio importantíssimo da vida”, constata. Essa percepção motivou pesquisadores vinculados ao ambulatório a desenvolver alguns estudos sobre o assunto. Uma das pesquisas contou com a participação de 68 pacientes. A prevalência de disfunção sexual foi de 79,6%, bastante superior à relatada na literatura em mulheres saudáveis, que é de até 40%.
No ano passado, os pesquisadores fizeram outra investigação com os pacientes e profissionais do ambulatório. “Queríamos justamente iniciar a conversa: o profissional de saúde precisa estar atento e disposto a abordar questões relacionadas a atividades sexuais dos pacientes com artrite reumatoide, e o paciente também deve entender que muitas das dificuldades encontradas podem ser superadas com pequenas modificações”, conta Pedro Henrique de Almeida. Ele diz que alguns medicamentos, por exemplo, podem diminuir a lubrificação vaginal ou levar à falta de libido. Além disso, a dor e a rigidez articulares causadas pela artrite reumatoide dificultam ou até impedem o ato sexual.
Nesses casos, conversar com o médico sobre a possibilidade de troca da medicação ou de alteração do horário de ingestão do remédio são formas de facilitar a atividade sexual. “O paciente pode usar várias outras estratégias: reservar mais tempo para a atividade sexual; tomar um banho morno antes do sexo para aliviar a dor e aumentar a mobilidade articular; usar lubrificantes à base de água; modificar posições sexuais adotadas, evitando permanecer em uma postura que cause dor nas articulações, procurando apoios para distribuir o peso do corpo (utilizando a cama, almofadas, travesseiros) e evitar fadiga durante o ato”, ensina o terapeuta. O resultado dessa pesquisa está no artigo “Como o reumatologista pode orientar o paciente com artrite reumatoide sobre função sexual”, publicado na Revista Brasileira de Reumatologia.